O cheiro de café torrado e bolo de fubá, antes sinônimo de lar, virou aroma de velório. Minha irmã adotiva, Isabela, brindava ao lado do meu marido, Pedro, usando o colar de pérolas que ele me deu em nosso primeiro aniversário de casamento, com um sorriso de triunfo venenoso. Pedro, o homem por quem larguei tudo, anunciava Isabela como sua nova sócia, enquanto meus pais adotivos, Fernando e Lúcia, a olhavam com um orgulho que nunca direcionaram a mim. Todos aplaudiam, me tornando invisível, uma peça de mobília esquecida, meu lugar na vida, na empresa e ao lado de Pedro sendo entregue publicamente. Depois de meses presa, ouvi Isabela dizer a Pedro: "Ela não serve mais para nada. É só um peso morto", e a resposta dele, resignada, foi: "Sei, mas as coisas melhoraram quando ela chegou. Não quero arriscar." Eu era um amuleto da sorte para eles, mas sem o qual o império deles desmoronaria. Meus pais e Isabela me visitaram no meu quarto-prisão, ela jogou no chão o medalhão de ouro da minha avó, a única joia que me restava, a última conexão com o amor incondicional, e ele se partiu. Naquele instante, Pedro chegou e, sem questionar, acreditou na mentira de Isabela, que eu mesma havia jogado o medalhão. Ele se aproximou, e com uma voz baixa e perigosa, declarou: "A partir de hoje, as regras mudam. Você não sai deste quarto. Sua única função nesta casa é existir. Você é meu amuleto, Marília. E amuletos não têm vontade própria. Eles ficam guardados na caixa. Entendeu?" A mulher que amava Pedro, que acreditava em família, morreu naquele instante, e em seu lugar, nasceu uma pessoa forjada pela traição e dor, uma pessoa que faria Pedro Alcântara se arrepender amargamente. Eu estava grávida de cinco meses quando Isabela me convidou para um passeio a cavalo. Ela assustou o cavalo, me fazendo cair e perder nosso bebê, e a última coisa que vi em seus olhos não foi pânico, mas triunfo. Pedro me internou em uma clínica psiquiátrica de luxo, me tratando como louca, humilhando-me com mentiras sobre meu estado mental. Descobri que Isabela sussurrou para ele que a gravidez talvez não fosse dele, usando como desculpa para me trancafiar e calar. A tristeza deu lugar ao ódio, e eu decidi que Pedro e Isabela iriam pagar, não apenas pela perda do meu filho e da minha liberdade, mas por cada humilhação. No quarto, Isabela me acusou de empurrá-la, e Pedro, sem hesitar, me agrediu, me dando um tapa. "Se eu morrer, Pedro", eu disse, a voz cheia de veneno, "Se algo acontecer comigo... você perde tudo. Tudo." Ele hesitou, e eu sabia que ele, em algum nível, acreditava em minhas palavras. Pedro me arrastou para o porão escuro, fedorento a mofo, onde guardavam querosene e jornais velhos, e me jogou como um saco de lixo, fechando a porta e trancando-a. "Você vai ficar aqui até aprender a se comportar. Sem comida, sem água, até que você me peça perdão de joelhos." No escuro, a raiva se transformou em fogo, e com os restos de querosene e fósforos, incendei o porão. Enquanto eles corriam, e Pedro me chamava, eu escapei por uma pequena janela enferrujada e corri pela floresta escura, enquanto a casa dos Alcântara queimava e Pedro via sua sorte morrer nas chamas. A sorte de Pedro se tornou uma maldição, e ele viu seu império desmoronar enquanto eu estava livre.