Eu era Larissa, a garota privilegiada do colégio, com uma vida de livro aberto e sem preocupações. Ele era Lucas, o menino invisível do fundo da sala, com roupas simples e um olhar que parecia carregar o peso do mundo. Nossos mundos não poderiam ser mais diferentes, mas um sorteio de duplas na aula de história nos uniu. Foi quando os cochichos maldosos começaram: "Logo ele? O esquisito? Pede para a professora trocar." Minha melhor amiga, Júlia, sussurrava, e até a professora Marta questionava: "Tem certeza, Larissa? Vocês são... bem diferentes." Aquela palavra, "diferentes", carregava um veneno que eu não suportava. Ignorei o preconceito, ignorei os olhares, ignorei Júlia. Decidi me sentar ao lado de Lucas, sem saber que aquela escolha mudaria tudo. Eu, com minha bolha de privilégios, descobri a verdade: Lucas vivia em uma favela, lutava pela sobrevivência e comia apenas o pão de queijo que eu "exagerava" no lanche para alimentar sua irmã mais nova. Minha admiração por ele só crescia. Ninguém via a inteligência afiada por trás do silêncio dele, a mente brilhante que eu tanto queria desvendar. Quando o trabalho de colégio se transformou em humilhação pública, com a professora Marta usando sua pobreza para atacá-lo na frente de todos: "Lucas, você poderia nos dar um exemplo mais... pessoal? Como é a realidade na sua comunidade? Vocês conseguem ter acesso a saneamento básico? Ou a comida na mesa todos os dias?" . E Júlia, minha suposta melhor amiga, se juntou à professora: "Talvez, para o bem deles, fosse melhor separá-los." Fui ignorada e, de repente, sentada na frente, a distância entre nós era um abismo. Mas o fundo do poço veio quando Lucas, o garoto puro e digno da favela, apanhou em silêncio para proteger seu futuro, um soco no rosto, um baque surdo na parede. "Se eu... se eu brigasse... seria expulso. Eu não posso... não posso perder a bolsa de estudos. É minha única chance." Ele sussurrou, a voz fraca e machucada. Eu me recusei a aceitar. Eu não o peguei da enfermaria sem um plano, sem a certeza de que ele ficaria comigo. Liguei para meu pai, e com ele, prometi, ninguém mais o machucaria. Eu o traria para minha casa, eu cuidaria dele. E jurei, naquele momento, que nosso destino seria entrelaçado para sempre.