Na comunidade onde nasci, a capoeira ditava o ritmo dos nossos dias. Minha avó, Mestra Jurema, curandeira e lenda, possuía um "dom" místico que a tornava a figura mais respeitada. Ela tinha duas netas abençoadas com esse dom: Clara, leitora de búzios, e Sofia, com o poder de curar doenças. E havia eu, Ana, a "inútil", destinada a servir na sombra de suas glórias. Até que o Líder do bairro, um homem poderoso e corrupto à beira da morte, nos convocou. Ele exigiu um casamento de aliança, e minhas irmãs rapidamente escolheram seus companheiros, homens de poder e sucesso. Para mim, sobrou o "ingênuo", um sonhador sem posses. Riram de mim, me chamaram de cega, sem visão. Mas um sorriso misterioso surgiu em meus lábios. Ignorei o destino que me impuseram. "Quero me casar com o senhor, Líder. Desejo a sua proteção." O silêncio foi denso, o choque preencheu o ar. Minhas irmãs me olharam como se eu estivesse louca, querendo me unir a um homem com um pé na cova. Minha avó, aquela que devia ser a mais forte, acabou cega, expulsa e morta pelos cães do palácio do Líder. Toda a sua honra simplesmente se desfez. Mas foi ela quem me contou a verdade: o dom dela era, na verdade, uma trama. O que eu faria? A vingança seria a solução? Eu, Ana, a "inútil" , a "sem dom" , prometi vingança à minha avó. E meu primeiro passo seria a "Boca de Ouro" .