Quando o médico me disse que precisava de uma transfusão de sangue de emergência, o meu marido, Pedro, estava ao telefone como se nada fosse, discutindo a cor das cortinas do quarto do bebé. A voz dele era impaciente, mas com um carinho que raramente me mostrava. Eu estava ali, a esvair-me em sangue, com a hemorragia pós-parto a não parar. Acontece que o meu tipo de sangue era raro, e só Pedro era compatível. Ele tinha o poder de me salvar. Mas quando lhe pediram para doar, ele riu-se, disse que tinha pavor de agulhas e que estava exausto. Até me acusou de ser dramática, perguntando por que é que eu não podia ter tido um parto normal como toda a gente. Depois, virou costas e foi ver a nossa filha, Eva, deixando-me à beira da morte. Enquanto a minha vida (e a do nosso casamento) se esvaía, uma enfermeira apareceu com uma bolsa de sangue. Alguém doou, mas não foi ele, o homem que jurei amar e que me tinha prometido um futuro juntos. Ele nem sequer me perguntou se eu ia sobreviver. A minha mãe entrou no quarto, os olhos vermelhos, e disse-me que, lá fora, Pedro se gabava da Eva ser parecida com ele, sem uma única preocupação comigo. Como é que alguém podia ser tão frio? Tão egoísta? Ele preferiu deixar-me morrer a enfrentar uma agulha! Que tipo de homem era este, que via a sua esposa à beira da morte e se preocupava apenas com a cor de umas cortinas e com o seu próprio conforto? Nesse momento, decidi. Iria sobreviver, por mim e pela minha filha. E o meu primeiro passo seria pedir o divórcio, custasse o que custasse.