O cheiro de desinfetante no hospital era forte, sufocante. Eu estava no corredor, a tremer, com o telemóvel na mão, tentando desesperadamente ligar para o meu marido. Lá dentro, a minha mãe lutava pela vida contra um cancro avançado. Finalmente, a chamada atendeu, mas não era a voz do Pedro. Era a da irmã dele, Sofia, a reclamar do tom de irritação, porque o Pedro estava "ocupado" na festa de aniversário do sobrinho. Enquanto a minha mãe estava entre a vida e a morte, eles celebravam. "A tua mãe vai ficar bem. Não sejas tão dramática", disse ela, antes de desligar com desdém. O telemóvel escorregou da minha mão, o som ecoando no vazio. As suas palavras, "Vamos passar por isto juntos, meu amor", repetiam na minha cabeça, agora vazias. O palhaço e a festa eram mais importantes que a vida da minha mãe. Quando a cirurgia acabou e o médico disse que ela estava estável, o alívio deu lugar a uma raiva fria e avassaladora. Recebi uma mensagem do Pedro: "Desculpa, amor. A festa estava uma loucura. Ligo amanhã." Amanhã. Era a gota de água. Sem pensar duas vezes, enviei uma única frase: "Pedro, quero o divórcio." A partir daquele momento, a minha vida nunca mais seria a mesma. Eu estava prestes a lutar pela minha liberdade.
