Por um momento, ela ficou imóvel à beira da cama, observando o quarto que ainda respirava sombras. As paredes brancas guardavam segredos que ninguém poderia ouvir. Os lençóis ainda tinham o perfume dele. O nome Pietro ecoou em sua mente, suave e devastador, uma oração e uma maldição ao mesmo tempo.
O homem que ensinou mais do que direito. O homem que a fez acreditar, mesmo escondida, que o amor podia florescer no escuro.
Nove meses.
Nove meses de encontros proibidos, olhares trocados em corredores silenciosos, bilhetes escondidos entre livros de Direito Penal, toques rápidos atrás de portas fechadas.
Nove meses entre o paraíso e o precipício.
E agora, a beira do fim, o coração dela batia com a esperança de que ele escolheria o amor, de que aquele amor deixaria, enfim, de viver nas sombras.
Levantou-se devagar, o chão frio sob os pés descalços, e foi até o espelho. O reflexo devolveu uma mulher diferente da menina que chegou à Inglaterra sonhando com diplomas e méritos. Agora, havia um brilho novo no olhar, frágil e intenso.
Ela vestiu o longo vestido de seda dourada que abraçava o corpo com elegância quase real. Os cabelos, em ondas perfeitas, caíam sobre os ombros nus. Quando calçou os saltos, sorriu, mas o sorriso tremia, porque a beleza era só uma máscara sobre o medo.
Hoje, ele prometera conversar sobre o futuro.
Hoje, ela acreditava que Pietro escolheria ficar.
A buzina soou lá embaixo.
Anne Marie, sua melhor amiga, estava encostada no carro conversível, vestindo um azul cintilante que chamava atenção até dos anjos.
- Sophia, meu Deus! - exclamou, dando uma volta em torno dela como uma estilista inspecionando sua obra-prima. - Se o professor Pietro não se ajoelhar hoje, eu mesma peço sua mão.
Sophia riu, nervosa.
- Você acha mesmo?
- Acho? Tenho certeza! - respondeu Anne, animada. - Se isso aqui não for amor à primeira vista, não sei mais o que é.
As duas riram e seguiram pela cidade, entre risadas e lembranças. Mas, dentro de Sophia, um nó apertava.
O coração dela, teimoso, batia no compasso de uma prece silenciosa.
Quando o carro estacionou diante do Royal Kensington Hotel, o mundo pareceu parar.
O edifício erguia-se em mármore e luz. O tapete vermelho estendido na entrada era quase um prenúncio do que ela sonhara por meses, a noite em que tudo se tornaria público.
Dentro, o salão era um mar de brilho e música. Lustres de cristal pendiam do teto como estrelas caídas, refletindo em taças de champanhe e vestidos luxuosos. A orquestra tocava uma valsa antiga, e o murmúrio elegante das conversas criava um fundo de magia.
Mas Sophia só tinha olhos para um homem.
Ele estava ali, conversando com reitores e colegas.
O terno cinza moldava os ombros largos, a gravata dourada refletia a luz dos lustres. O sorriso dele, aquele sorriso que ela conhecia de cor, parecia mais frio sob as luzes oficiais.
E, mesmo assim, ela se perdeu.
O coração dela bateu descompassado.
Cada passo em direção a ele era uma confissão muda.
Anne apertou sua mão, sussurrando com emoção:
- Vai lá, garota... vai buscar o teu final feliz.
Sophia inspirou fundo. Caminhou até ele. A música parecia se calar.
E então, com a delicadeza de quem toca o impossível, pousou a mão sobre a dele.
Mas Pietro... se afastou.
Sem olhar.
Sem dizer uma palavra.
Como se aquele toque fosse um erro.
O mundo pareceu congelar.
E quando ele finalmente falou, o som da voz dele foi uma lâmina:
- Senhores, apresento as alunas Anne Marie e sua amiga, Sophia Jones.
Amiga.
A palavra ecoou como um tiro.
O sorriso dela quebrou por dentro.
O coração, antes cheio de esperança, se partiu em silêncio.
Os rostos à volta se misturaram, as vozes se tornaram distantes.
Sophia tentou respirar, mas o ar fugiu dos pulmões.
O homem que prometera o futuro a reduzia agora a uma sombra.
A um segredo.
A um erro conveniente.
Anne, sem saber o que fazer, apenas a olhou com os olhos marejados. Sophia, porém, ergueu o queixo e sorriu. O tipo de sorriso que dói de se ver, elegante, sereno... e completamente partido.
Cumprimentou os reitores, trocou palavras educadas, fingiu estar bem. Mas dentro dela, um incêndio silencioso consumia tudo o que restava.
Ele nunca teve a intenção de ficar.
Nunca quis o amor que ela sonhou.
Quando ele se virou de novo para outra conversa, sem sequer reparar na ausência dela, Sophia soube com uma clareza cruel:
Pietro jamais a amaria à luz do dia.
Do lado de fora, o vento frio de Londres cortava o rosto dela.
As luzes do hotel, antes douradas, pareciam agora um cenário falso de um teatro cruel.
Ela desceu os degraus com o vestido levantado, os saltos ecoando no mármore, o coração em ruínas. Chamou um carro com as mãos trêmulas. E só quando as portas se fecharam atrás dela, o silêncio a venceu.
As lágrimas caíram. Lentas. Salgadas. O peito arfava como se faltasse ar.
Ela levou a mão ao ventre, o segredo que guardava sozinha. A pequena vida que crescia ali. E, com a voz embargada, fez um juramento ao vazio:
- Eu vou te amar com tudo o que ele negou a nós dois. E vou arrancar esse homem do meu coração, mesmo que isso me mate um pouco mais a cada dia.
O carro partiu.
Lá fora, Londres seguia seu ritmo cinzento, indiferente.
Mas dentro dela, uma nova história começava, escrita com lágrimas, coragem e um amor que já não precisava ser correspondido para existir.