O vento frio no terraço do hospital chicoteava meu cabelo, enquanto as luzes de São Paulo lá embaixo pareciam estrelas distantes e mortas. Meu telefone estava caído ao meu lado, e a última mensagem queimava em minha mente. Era do meu namorado, Lucas, o famoso jogador de futebol: "Sofia, a Bianca precisa desse rim. Seja razoável. Seus pais te criaram, é o mínimo que você pode fazer." Razoável. Eles não me adotaram por amor; eu era só uma bolsa de órgãos reserva para a filha biológica deles, Bianca. A dor da cicatriz na minha barriga era fantasma comparada à traição que rasgava meu peito. Eu perdi tudo: meu namorado me largou por mensagem, meus "pais" me expulsaram, perdi minha saúde, minha dignidade e um rim. Olhei para o abismo, a queda parecia a única saída, até que uma voz grave me assustou: "Não faça isso." Era um bombeiro, com olhos intensos e preocupados, que tentava me convencer a não pular. Gritei minha verdade para ele, sobre como fui usada e jogada fora por aqueles que deviam me amar. Eles tiraram tudo de mim! Meu namorado me traiu com a minha irmã! Meus pais... meus pais só me criaram para roubar um órgão de mim! Eles me usaram! Você entende? Eu era só uma peça de reposição! Ele me olhou com uma compaixão que partiu meu coração. Eu me joguei, mas em vez do impacto brutal, senti braços fortes me envolvendo. O bombeiro. Ele pulou atrás de mim. De repente, acordei no meu apartamento, sem cicatriz e sem dor. A data no meu celular me fez congelar: uma semana antes da minha cirurgia. Eu voltei no tempo. As lágrimas agora eram de alívio, raiva e determinação. Eu não seria mais a vítima. Eu os faria pagar. E o bombeiro? Eu precisava encontrá-lo, agradecê-lo. Ele, sem saber, me deu de volta não apenas minha vida, mas também meu futuro.