Quando abri os olhos, o teto estéril do hospital foi a primeira coisa que vi, e o cheiro a desinfetante confirmou a cruel realidade. A minha mão instintivamente pousou na minha barriga... estava lisa. Completamente lisa. O meu bebé, que carreguei por nove meses, tinha desaparecido. O meu marido, Pedro, estava ao lado da cama, de cabeça baixa, absorvido no telemóvel, sem sequer notar que eu tinha acordado. A sua irmã, Sofia, choramingava ao telefone: "Mãe, a Eva está bem, só um aborto espontâneo, não é nada demais." Aquelas palavras foram facadas no meu peito. Não foi um aborto espontâneo. Foi uma escolha. A escolha do meu marido. Quando o carro descontrolado veio na nossa direção, Pedro não hesitou. Ele empurrou-me com força para o lado, usando o meu corpo como escudo para proteger a irmã atrás de mim. Caí no chão, a dor lancinante começou. Lembro-me do sangue. Muito sangue. Lembro-me da cara de pânico de Pedro... mas não por mim, e sim por Sofia, que só tinha arranhado o joelho. Ele correu para ela, ignorando-me completamente, deixando-me a sangrar na calçada até um estranho chamar uma ambulância. E agora, a sua família tratava a minha perda com total indiferença. A minha sogra, a Sra. Helena, entrou no quarto e, depois de abraçar Sofia, virou-se para mim, a sua voz gélida: "Ouvi dizer que estás a causar problemas. E de quem é a culpa? Se fosses mais forte, talvez tivesses conseguido aguentar o bebé. Mulheres passam por coisas piores e não perdem os seus filhos. Talvez simplesmente não fosses feita para ser mãe." As suas palavras foram o golpe final. A dor deu lugar a uma fúria gelada. "Quero o divórcio, Pedro," disse, a minha voz calma e fria. Ele e a sua família riram, acreditando que uma órfã sem dinheiro como eu não conseguiria nada. Mas eles subestimaram a determinação de uma mulher que já não tinha nada a perder.