Confesso que ser mãe solteira não estava nos meus planos, mas aconteceu. Não como estão pensando. Eu amava um homem que também me amava, mas quando o sucesso e o dinheiro bateram à sua porta, ele os amou mais que qualquer outra coisa.
Com o tempo, vi um homem gentil e bondoso, se tornar arrogante com os mais humildes. Aquele que sempre estendia a mão aos necessitados, agora lhes dava as costas. O amor pelo próximo, tornou-se desprezo por todos aqueles que não estavam no seu patamar social e isso abriu uma rachadura no meu coração.
O que aconteceu com você, Adam?
Aonde está o homem que eu conheci?
O homem com quem sonhei me casar e ter f ilhos?
P or mais que doa, a verdade é que aquele homem desapareceu e com ele, a sensação que me incendiava por inteira e que fazia o meu coração palpitar mais forte, enquanto eu suspirava ao nos imaginar juntos, por toda a vida, até que a morte nos separasse. Contudo, não foi a morte que nos separou...
Foi ele mesmo.
Adam Agu iar, o meu ex-noivo, pai do meu filho e, também,o CEO e fundador da Send Nudes - um serviço por assinatura no qual os criadores de conteúdo compartilham fotos e ví deos adultos para os seus assinantes.
Q uem conhece a gaita, j á sabe quem tá chegando. Q uem conhece a gaita, j á sabe quem tá chegando.
Jú-liooooo!
Ab e rtu ra - A Tu rma do Coc oric ó .
Silêncio e Adriel são duas coisas que não ocupam o mesmo espaço. Da cozinha, eu conseguia ouvir o som da música do seu seriado preferido tocar e não era preciso ir até lá para saber que ele estava saltitando em cima do sofá.
Depois da onda do baby shark e do pão de queij o, o novo ví cio aqui de casa era o Cocoricó. Não é o meu gênero musical, mas de tanto ouvir involuntariamente, aprendi a cantar a música.
- Você está pulando no sofá? Abaixe o volume da TV. - ergui o tom de voz para que ele ouvisse e apesar de não ter tido uma resposta vocal, o volume da TV diminuiu.
Sacudi a cabeça e sorri, terminando de lavar a louça do almoço.
O meu pequeno é assim. Ele não é muito de conversa, mas quando se dispõe a falar, haja paciência. Com quatro anos, ainda não sabe ler, mas já fala quase tudo corretamente. Inclusive, também pergunta muito...
Eu tenho papai?
Sempre que ouço isso, me sinto a pior mãe do mundo. Sim, ele tem pai, mas o pai não sabe da sua existência. E não, não
escondi a gravidez do pai. Quando terminamos, eu não sabia que estava grávida. Na verdade, descobri a gestação só alguns meses depois e na época, achei que fosse melhor assim, só eu e ele.
Contudo, percebi que nem sempre o que achamos ser correto é o correto. Uma criança precisa do pai. Uma criança só deve crescer sem um pai, se não houver outra opção e esse não é o caso do meu filho.
P or esse mesmo motivo, às vezes, me sinto culpada por não ter uma boa resposta para as suas perguntas. Sei que em algum momento, a resposta de que o papai está viaj ando, não vai mais servir. Ao mesmo tempo, eu também vejo o óbvio acontecer. Depois de quatro anos, procurar por Adam Aguiar e contar que tenho um filho com ele, soaria, no mí nimo, como o golpe da barriga.
Disso, não tenho dúvida.
A verdade é que ainda resta em mim um pouco de orgulho, mas, mesmo assim, como mãe, eu penso no meu filho. Sei que vai chegar o momento em que vou ter que engolir esse orgulho e lhe apresentar o pai.
Que tipo de mãe eu seria se o privasse do carinho paterno? A pior das piores. Eu só preciso de um pouco mais de tempo para superar tudo o que aconteceu e...
O celular tocou, interrompendo os meus devaneios. No visor, vi o nome de Elaine, a minha melhor amiga e madrinha de Adriel. Enxuguei as mãos em um pano de prato e rapidamente atendi o telefone, escorando o traseiro na pia.
- Boa tarde, P epe. - Elaine me chamou pelo apelido carinhoso que havia me dado na infância. - Estou ligando para saber como estão as coisas.
- Estamos de férias. Consegui encaixar as minhas férias com as dele. - respirei fundo. - Acho que a minha mãe deve vir para cá no fim de semana.
- Sério? - a surpresa era palpável, afinal, mamãe não saí a muito do interior. Geralmente, éramos nós quem í amos ao seu encontro. - Já quero um jantar em famí lia.
- É só marcar. - assenti com a cabeça.
Depois de um breve silêncio, a ouvi suspirar do outro lado da linha. Endireite-me, pronta para ouvir o que viria dessa vez.
- P reciso de um favor.
- Só um? - brinquei, arrancando-lhe uma risada.
- É, dessa vez, é apenas um.
- Diga!
- Estou com uma funcionária a menos e o meu buffet foi contratado para um evento muito importante e...
- Sim, eu posso ajudar. - interrompi-a e respirei fundo. - Contudo, saiba que a vizinha que ficava com o Adriel, está viajando.
Silêncio.
Como madrinha do meu pequeno, Elaine sabe perfeitamente que eventos e Adriel, não combinam. P rincipalmente, se houver algum animalzinho presente. Ele é obcecado por animais e o seu sonho é ter um bichinho de estimação, mas vou esperar ele crescer mais um pouco, afinal, animal não é brinquedo e é necessário lhe ensinar as responsabilidades de ter um pet.
- Não tem problema. Eu fico de olho nele. - quando ela disse aquilo, não consegui me segurar e gargalhei automaticamente. - O que foi? - resmungou.
- Pelo visto, o evento com a torre de doces já caiu no esquecimento...
- P or Deus, eu nunca vou me esquecer daquilo. - disse, quase que ofegante. - P ensei que nunca mais teria clientes depois daquele dia.
- Seu afilhado. - Lembrei-a.
- Seu filho. - Elaine retrucou, com bom humor. Rimos.
- Bom, dessa vez eu tenho um plano, ok?
Respirei fundo e sacudi a cabeça algumas vezes, até que resolvi concordar. Seria bom ir, pois há alguns dias ele havia dito que estava com saudades da "dinda". Em todo caso, já mandei a real.
- Qualquer prejuí zo que ele venha causar, será de responsabilidade sua.
- Combinado. - ela riu. - Agora preciso terminar de organizar as coisas. Vou te mandar a localização e o horário, ok?
- Ok.
- Até mais e beijinhos.
- Beijinhos. - respondi, desligando a ligação. Dinheiro extra é sempre bom.
Cuidar de uma criança, custa caro e apesar de ser formada em ciências contábeis, a crise me obrigou a optar por um emprego fora da minha área de atuação, sendo assim, atualmente, trabalho como vendedora em uma loja de eletrodomésticos.
O salário com os descontos, beira os três mil reais. E essa quantia para uma mãe solteira e que paga aluguel, não é muito, mas dá para pagar as contas.
- Mamãe? - ouvi-o me chamar, seguido dos pezinhos descalços estalando no chão.
De repente, ele surgiu na entrada da cozinha, mirando-me com aqueles olhinhos azulados com curiosidade.
- Dinda? - perguntou.
P rovavelmente, ele me ouviu falar ao telefone.
- Sim, era a Dinda.
- Vamos ver a Dinda? - deu pulinhos, abrindo um imenso sorriso desdentado.
- Amanhã. - dei um passo a frente e quando me abaixei, toquei seu narizinho com o indicador. - Vamos ajudar a Dinda, ok?
- ele assentiu com a cabeça. - Vai se comportar? - assentiu novamente e quando afinei os olhos, ele riu.
- E-E-Eu vou, mamãe. - miou, enchendo as bochechinhas
de ar.
- É isso aí !- sorri, bagunçando os seus cabelos, acabando por lhe arrancar outro sorriso, ainda mais gostoso que o primeiro.
Após o banho das dezoito horas, pedimos uma pizza e fomos assistir um filme infantil. Quando percebi, o meu pequeno estava adormecido no sofá. Mirei-o por alguns instantes.
Sim, Adriel é a cara do pai. Os traços no rosto são idênticos, assim como a cor dos olhos de um azul intenso e o tom de pele - branco feito um papel. Os cabelos anelados, provavelmente são o meio termo, entre o liso de Adam e os meus cachos.
Espreguicei-me no sofá e me inclinei, pegando-o no colo. Ele se mexeu um pouco, mas logo se aninhou nos meus braços. Beijei a sua testa e admirei aquilo que eu mais amo em toda a minha vida.