O homem que me criou não apenas me rejeitou; ele orquestrou minha humilhação completa só para se livrar de sua responsabilidade.
De coração partido, fugi para Campinas para recomeçar. Conheci Arthur Joyce, um mentor brilhante e intenso que viu a dor que eu tentava esconder. Mas, assim que comecei a me sentir segura, ele me encurralou, seus olhos guardando um segredo chocante.
"Alina", ele sussurrou, sua voz baixa e urgente. "Qual é o nome da sua mãe?"
Capítulo 1
Alina Ferraz POV:
Sete anos.
Foi o tempo que amei Ricardo Veiga, o homem que deveria ser meu tutor, meu protetor, a única família que me restava no mundo. Ele era o melhor amigo do meu pai e, quando papai morreu, Ricardo preencheu o vazio imenso, não apenas como um guardião legal, mas como a âncora da minha existência frágil.
Meu amor por ele não foi algo que cresceu aos poucos; foi uma explosão, um fogo imediato e avassalador que iluminou meu mundo. Cada olhar, cada toque, cada palavra dele era como oxigênio, sustentando essa esperança desesperada dentro de mim.
Eu tinha vinte e dois anos agora, uma universitária, mas na presença dele, eu ainda era a garotinha assustada que ele acolheu, ansiando por sua aprovação, seu afeto, seu amor. Construí meu mundo inteiro ao redor dele, cada sonho, cada ambição, sussurrava seu nome. Ele era meu sol, minha lua, meu universo inteiro.
Mas esse universo implodiu no dia em que finalmente me confessei.
Aquelas três palavras, "Eu te amo", pareceram rasgar meu peito e oferecer a ele meu coração pulsante. A resposta dele não foi raiva, nem mesmo pena. Foi pior. Frieza. Indiferença. Uma rejeição tão absoluta que parecia que ele tinha arrancado uma parte de mim.
Ele não apenas rejeitou meu amor; ele me expulsou de nossa cobertura em São Paulo. Não com um grito, mas com uma instrução silenciosa e oca para fazer minhas malas, para encontrar meu próprio caminho.
Sua voz era monótona, desprovida de qualquer calor. "Alina, você precisa crescer. Isso não é saudável."
Saudável? Minha vida inteira foi definida por ele, por nós. O que não era saudável era a forma como ele conseguia ficar ali, olhando para mim, a garota que ele criou, e não mostrar um pingo de emoção enquanto destruía meu mundo.
Eu não fui embora de imediato. Tentei de tudo para fazê-lo sentir alguma coisa, qualquer coisa. Por noventa e nove dias, joguei um jogo perigoso, esperando provocar uma reação. Estourando o limite dos seus cartões de crédito, arrumando problemas com a polícia, recebendo ligações de proprietários furiosos de apartamentos baratos em que eu mal ficava.
Cada loucura era um grito desesperado por atenção, uma crença tola de que, se eu o pressionasse o suficiente, ele finalmente me veria, me veria de verdade, não como uma criança, mas como uma mulher sangrando por seu amor.
Na primeira vez, depois que gastei uma quantia ridícula em uma bolsa de grife que eu nem queria, a assistente dele ligou. Não o Ricardo. Apenas um e-mail seco e educado avisando que minha "mesada" seria severamente cortada se eu não mostrasse mais "responsabilidade fiscal".
Responsabilidade fiscal! Meu coração afundou. Ele nem se importava o suficiente para ficar com raiva.
Depois vieram os "problemas". Uma briga de bar que não comecei, mas certamente não evitei. Uma ligação para o escritório dele da delegacia. Imaginei-o correndo até lá, furioso, preocupado. Mas não. No dia seguinte, um advogado júnior resolveu tudo, papelada e um sermão severo sobre conduta. Ricardo permaneceu em silêncio. Era como se eu fosse um problema a ser delegado, não uma pessoa a ser confrontada.
Minha tentativa mais desesperada foi ligar para ele tarde da noite, fingindo estar perdida, com medo. Esperei por suas palavras ríspidas, sua irritação, qualquer coisa. Em vez disso, sua voz, calma e distante, simplesmente disse: "Mandei um carro. Por favor, certifique-se de fazer escolhas melhores, Alina."
Nenhuma preocupação, nenhuma urgência, apenas uma indiferença infinita e ecoante.
Foi então que eu soube. Ele não estava se fazendo de difícil. Ele não estava me testando. Ele simplesmente não se importava. Não da maneira que eu precisava, não de uma forma que realmente importasse para ele. A percepção me atingiu como um golpe físico, me deixando sem ar na solidão silenciosa do meu apartamento barato. Ele realmente queria que eu fosse embora.
Semanas se transformaram em meses depois disso, uma névoa implacável e entorpecente. Minhas tentativas de provocá-lo morreram lentamente, substituídas por uma dor surda. Eu estava à deriva, sem âncora, sem propósito. As luzes da cidade do lado de fora da minha janela não tinham mais seu brilho mágico; elas apenas refletiam meu próprio olhar vazio. Essa era minha vida agora, um exílio autoimposto, alimentado por um coração partido e uma necessidade desesperada de não sentir absolutamente nada.
E foi assim que me encontrei aqui, largada em uma cadeira de plástico duro em uma delegacia bem iluminada. O ar cheirava a café velho e desinfetante, uma combinação perfeita para a dor latejante atrás dos meus olhos. Desta vez, não foi para provocá-lo. Foi apenas um acidente, um erro estúpido e desajeitado que resultou em uma acusação de pequeno furto. Eu estava cansada, distraída e, honestamente, simplesmente não me importava o suficiente para discutir com o gerente da loja ou com o policial.
Uma policial de rosto gentil, seu uniforme impecável e sua voz suave, se inclinou. "Você está bem, querida? Parece que teve uma noite difícil."
Suas palavras, simples como eram, pareceram pequenas agulhas perfurando uma ferida dormente. Eu apenas assenti, incapaz de formar uma resposta coerente.
Então, um som cortou o silêncio nebuloso. O clique distinto e medido de sapatos caros no piso de linóleo. Era um ritmo que eu conhecia intimamente, uma cadência que costumava sinalizar segurança, depois controle, e agora... eu não sabia mais o que sinalizava. Minha respiração ficou presa na garganta.
Meu estômago se contorceu em um nó, um pavor frio se enrolando em minhas entranhas. Minhas mãos, apoiadas nos joelhos, se fecharam involuntariamente.
Ele estava aqui.
Depois de todo esse tempo, depois de todas as minhas tentativas desesperadas por sua atenção, ele finalmente estava aqui, mas não porque eu queria que estivesse. Não por amor. Apenas porque eu era um problema que ele tinha que resolver.
Ricardo Veiga estava na porta, uma silhueta nítida contra as luzes fluorescentes. Seu terno sob medida parecia deslocado no ambiente estéril, acentuando sua elegância controlada. Seus olhos escuros varreram a sala e pousaram em mim. Sem surpresa, sem raiva, apenas um olhar frio e avaliador que me fez sentir totalmente transparente.
Ele falou com o sargento da recepção, sua voz baixa, mas autoritária, suas palavras cortando a burocracia como um laser. Ouvi trechos: "minha tutelada", "mal-entendido", "papelada". Em poucos minutos, a atmosfera mudou. A policial gentil me ofereceu uma garrafa de água, seu sorriso pedindo desculpas. O sargento assentiu deferentemente para Ricardo. Assim, meu "problema" estava se dissolvendo, tornado insignificante por sua mera presença.
Ele se virou para mim então, e eu só consegui encarar meus tênis surrados, incapaz de encontrar seu olhar. O silêncio se estendeu, pesado e sufocante. Senti-me pequena novamente, uma criança pega com a mão no pote de biscoitos, e a vergonha queimava mais quente do que qualquer raiva que ele pudesse ter demonstrado.
Um leve suspiro escapou dele. Então, um toque frio no meu pulso. Eu recuei, puxando um pouco para trás. Ele segurou minha mão, seu polegar roçando um pequeno hematoma desbotado nos meus nós dos dedos, um resquício daquela briga de bar.
"O que aconteceu aqui?" Sua voz ainda estava calma, mas havia uma mudança sutil, um indício de algo sob o verniz usual.
Minha garganta se apertou. Fazia tanto tempo que eu não dizia o nome dele em voz alta, não em um sussurro desesperado, mas em sua presença. Meus olhos se encheram de lágrimas, uma onda de choro contido ameaçando transbordar. Engoli em seco.
"Ricardo", consegui dizer, a palavra um apelo frágil.
Ele respirou fundo, seus ombros caindo quase imperceptivelmente. "Vamos para casa, Alina."
Não era um convite. Era uma ordem, pesada de resignação.
Levantei-me lentamente, minhas pernas pesadas, e o segui para fora da delegacia. As portas automáticas se abriram, revelando as ruas frias e escuras de São Paulo. Meu coração era um tambor surdo no meu peito, um ritmo de derrota. Casa. Um lugar que parecia mais frio do que qualquer rua.
A viagem de volta foi silenciosa, as luzes da cidade um borrão do lado de fora da janela. Minha mente, no entanto, não estava quieta. Era um turbilhão de memórias, fragmentos de um passado que moldou este presente agonizante. Lembrei-me da primeira vez que ele disse que "casa" significava com ele. Eu tinha quinze anos, recém-órfã, meu mundo estilhaçado em um milhão de pedaços. Meu pai, seu melhor amigo, se fora. Minha mãe, que sempre fora uma figura distante e etérea, desaparecera muito antes disso.
O funeral do meu pai foi um borrão de ternos pretos e condolências sussurradas. Eu estava lá, um fantasma na minha própria vida, agarrada à única constante que eu já conhecera – a mão dele. Mas a mão dele estava fria, sem resposta. O mundo era muito barulhento, muito brilhante, muito vazio. Lembro-me de pensar que nunca mais me sentiria aquecida.
Então, Ricardo estava lá. Ele se ajoelhou diante de mim, seus olhos gentis, sua voz uma âncora firme na tempestade. "Alina", ele disse, sua mão quente contra minha bochecha fria, "estou aqui. Você não está sozinha."
Ele tinha trinta e dois anos na época, já um advogado corporativo de sucesso, severo e afiado para o mundo exterior, mas para mim, ele era um farol. Ele prometeu cuidar de mim, ser meu tutor. Ele me mudou para sua cobertura enorme e minimalista, um mundo de distância da casa da minha infância. Ele me matriculou nas melhores escolas, certificou-se de que eu tivesse tudo o que precisava. Ele me ensinou a dar nó em gravata, a me portar em um jantar formal, a argumentar um ponto com convicção. Ele se tornou tudo.
Sete anos. Sete anos de sua presença inabalável, sua força silenciosa, seu apoio muitas vezes silencioso que confundi com algo mais. Sete anos em que o calor de sua mão na minha bochecha se transformou no peso esmagador de um amor não correspondido. Agora, aquele calor parecia uma memória distante e cruel.
Minha mãe partiu quando eu era pequena, uma vaga lembrança de um rosto doce e triste e o cheiro de tinta. Papai nunca falou muito sobre ela, mas o vazio que ela deixou era um frio constante. Ricardo preencheu esse vazio, sem querer, completamente. Ele era o pai, o amigo, o confidente que eu nunca tive de verdade. E eu, como uma planta desesperada por luz, voltei todos os meus brotos em crescimento para ele, torcendo-os em algo que ele nunca pediu, nunca quis.
Ele não era apenas meu tutor; ele era meu mundo inteiro. Ele me salvou, literalmente, de uma vida que eu não conseguia imaginar enfrentar sozinha. Como eu poderia não amá-lo? Como eu poderia não confundir gratidão com algo mais profundo, ou esperar que seu cuidado fosse um tipo diferente de amor?
O carro parou em frente ao prédio de sua cobertura, a familiar fachada de vidro e aço se erguendo sobre nós. A jornada silenciosa terminara, mas a emocional estava apenas começando.
Ele desligou o motor, mergulhando-nos em um silêncio mais profundo. Ele não olhou para mim, seu olhar fixo à frente. "Alina", ele começou, sua voz monótona, "precisamos ser claros. Minha responsabilidade com você é como seu tutor. Nada mais. Foi tudo o que sempre foi."
As palavras eram curtas, precisas, como um advogado dissecando um caso.
"Você mora sob meu teto", ele continuou, "você segue minhas regras. E minhas regras dizem que você deve se comportar com dignidade. Chega de loucuras com cartão de crédito. Chega de delegacias. Chega de jogos infantis."
Seu tom não deixava espaço para discussão.
Meu peito parecia pesado, como se uma laje de concreto tivesse se instalado ali. Engoli o nó amargo na garganta. Minha cabeça se curvou, um reconhecimento silencioso de seu decreto. Foi uma rendição, não de vontade, mas de espírito. O que mais havia a fazer?
Ele só queria que eu "crescesse". Que parasse de ser um problema, uma criança, um fardo emocional. Ele não queria meu amor. Ele queria minha obediência. E naquele momento, algo mudou dentro de mim. O fogo que ardera tão ferozmente por ele não se apagou com um gemido, mas com um estalo súbito e agudo, como gelo se partindo.
Quando fugi daquela cobertura pela primeira vez após minha confissão, esperei por sua ligação. Cada vibração do meu celular era um pequeno choque de esperança, uma oração desesperada para que ele finalmente percebesse o que estava perdendo.
Horas se transformaram em dias. Dias em semanas. As ligações nunca vieram. Eu dizia a mim mesma que ele estava me testando, que estava ocupado, que estava apenas esperando que eu recobrasse o juízo. Mas, no fundo, o silêncio era um tumor crescente, consumindo minha esperança.
Uma noite, o silêncio se tornou insuportável. Eu não conseguia respirar. Peguei um táxi, meu coração batendo um ritmo frenético contra minhas costelas, e voltei para o prédio dele. Fiquei do outro lado da rua, observando suas janelas, o brilho quente da lâmpada de seu escritório uma provocação cruel na escuridão.
Ele estava lá, exatamente onde sempre estava, curvado sobre sua mesa, debruçado sobre documentos legais. Seu rosto era uma máscara de concentração, sua testa franzida, mas não de preocupação por mim. Apenas com o trabalho. Ele parecia totalmente contente, totalmente imperturbável com minha ausência, com minha dor.
Naquela noite, a verdade amarga se instalou. Ele não estava indiferente porque estava com raiva, ou porque estava tentando me ensinar uma lição. Ele estava indiferente porque simplesmente era. Eu não fazia parte de sua paisagem emocional. Eu era uma responsabilidade, um dever, um problema a ser gerenciado. O pensamento foi uma mão gelada em meu coração, espremendo os últimos resquícios de calor dele. Como alguém podia ser tão completamente desprovido de sentimento por algo que nutriu por tanto tempo?
Foi quando as acrobacias imprudentes começaram. Os cartões de crédito, as aulas perdidas, os pequenos problemas com a lei. Qualquer coisa para quebrar aquela calma impenetrável, para forçar uma rachadura em sua indiferença. Um apelo equivocado e desesperado para que ele me visse, reagisse, se importasse.
Mas a cada vez, era a mesma coisa. Um assistente delegado, um e-mail distante, uma instrução silenciosa. Nunca a raiva que eu ansiava, nunca a preocupação que eu secretamente desejava. Apenas uma limpeza eficiente e legalista das minhas bagunças.
Eu me vi andando na corda bamba, forçando os limites, às vezes até da minha própria segurança, apenas para ouvir sua voz, para vê-lo me olhar com algo além daquele olhar vazio e avaliador. O hematoma na minha mão, aquele que ele acabara de tocar, era de uma queda desajeitada, mas poderia muito bem ter sido de um grito desesperado no vazio.
O pior, talvez, foi a noite em que fiquei verdadeiramente, irremediavelmente bêbada. Liguei para ele, não com uma emergência falsa, mas com dor crua e não filtrada. "Por que você não me ama, Ricardo?" Eu balbuciei, lágrimas escorrendo pelo meu rosto, "Por que você não pode simplesmente me amar de volta?"
Foi um apelo patético e quebrado ao telefone, as palavras grossas de uísque e desespero.
Sua voz, quando veio, foi um corte afiado através da minha névoa bêbada. "Alina", ele disse, calmo como sempre, "você precisa entender a diferença entre dependência e amor. É hora de você crescer. Crescer de verdade."
Ele disse aquelas palavras para mim, uma garota chorando seu coração, como se estivesse discutindo um relatório trimestral. Foi a última vez que me permiti desmoronar de verdade por ele.
Suas palavras foram uma pílula amarga, deixando-me com uma dor profunda e roedora que se instalou em meus ossos. Passei dias enrolada na cama, o mundo lá fora um zumbido embaçado e distante. Meu corpo parecia tão oco quanto meu coração, um cansaço constante se instalando sobre mim como um cobertor sufocante. Eu estava doente, não apenas emocionalmente, mas fisicamente também, um calafrio profundo que eu não conseguia afastar.
Depois disso, parei. Os noventa e nove dias de rebelião se transformaram em uma aceitação silenciosa e dolorosa. Voltei às aulas, encontrei um emprego de meio período e tentei me tornar a "adulta" que ele exigia. Era uma existência tediosa e solitária, mas era minha, e estava livre de sua atenção elusiva. Pensei que finalmente estava seguindo em frente, construindo uma nova vida fora de sua sombra.
Mas então a vida, como sempre faz, me jogou outra bola curva. Uma sessão de estudos tarde da noite, uma carteira perdida, um confronto repentino com um estranho que me confundiu com outra pessoa. A situação escalou rapidamente, e de repente eu estava me defendendo, não com raiva, mas com um instinto frio e desapegado que eu não sabia que possuía. A polícia me encontrou abalada, mas ilesa, a outra pessoa mais machucada do que eu. Fui levada para interrogatório, uma mera formalidade, mas aqui estava eu de novo.
E assim como antes, aqui estava ele. Ricardo. Meu tutor. Meu algoz. Meu passado inescapável, me puxando de volta para sua órbita.
Ele não perguntou sobre os detalhes do que aconteceu, sobre o estranho, sobre por que eu estava fora tão tarde. Suas perguntas eram puramente processuais, visando minimizar seu inconveniente. "Você está machucada?" ele perguntou, sua voz precisa. Não "Você está bem?", mas "Você está machucada?". A distinção parecia um abismo.
Naquele momento, observando-o, vendo a maneira casual como ele lidava com meu último "problema", eu finalmente entendi. Não era sobre mim. Não de verdade. Era sobre sua imagem, sua responsabilidade, seu controle. O último fio frágil de esperança, aquele que secretamente persistira apesar de todas as evidências, se partiu com um som suave e final. Não havia amor ali para mim. Não um amor como o meu, de qualquer maneira. Apenas dever, envolto em indiferença.
Quando finalmente paramos em frente ao prédio da cobertura, uma sensação estranha se apoderou de mim. Havia uma luz acesa na sala de estar, um brilho suave e desconhecido. Não era a luz forte e fria que Ricardo geralmente preferia.
A luz era quente, quase âmbar, um contraste gritante com a perfeição estéril usual de sua casa. Parecia... feminina. Deslocada. Um arrepio percorreu minha espinha, uma premonição de algo perturbador.
Ricardo não usou sua chave. Ele tocou a campainha. Um gesto pequeno, quase imperceptível, mas que enviou uma nova onda de pânico através de mim. Ele sempre usava sua chave. Sempre.
A porta se abriu, e uma mulher estava lá. Ela era deslumbrante, com cabelos ruivos flamejantes que caíam sobre seus ombros e olhos que brilhavam com uma confiança quase predatória. Ela estava vestindo uma das camisas de Ricardo, grande e casualmente jogada sobre o corpo, fazendo-a parecer ao mesmo tempo vulnerável e incrivelmente sedutora. Minha respiração ficou presa.
Seus olhos se iluminaram quando ela viu Ricardo. Ela se jogou em seus braços, envolvendo-se nele, seu rosto enterrado em seu peito. Ele a abraçou com força, um gesto suave e terno que eu nunca o vira oferecer a ninguém, muito menos a mim. Foi um soco no estômago, roubando o ar dos meus pulmões.
Eu fiquei congelada, uma estátua esculpida em gelo e dor. Minha mente girava, tentando processar a cena que se desenrolava diante de mim. Isso não podia ser real. Não depois de tudo. Não depois que ele acabara de me descartar com tanta precisão fria.
Ricardo afagou o cabelo dela, sua voz caindo para um murmúrio baixo e melódico que eu mal reconheci. "Larissa", ele disse, seu tom tingido de uma ternura que torceu uma faca em meu coração já sangrando. "O que você está fazendo acordada tão tarde?"
Larissa se afastou um pouco, sua cabeça se virando. Seus olhos, brilhantes e inquisitivos, pousaram em mim. Um sorriso lento e conhecedor se espalhou por seu rosto. "Ah, Ricardo, querido, esta é... a Alina?"
Sua voz era doce, quase doce demais.
Ela deu um passo à frente, estendendo uma mão perfeitamente manicure. "Oi", ela disse animadamente, "sou a Larissa. Larissa Castro. É um prazer finalmente te conhecer. Ricardo me falou tanto de você."
Então, seu sorriso se alargou, um brilho triunfante em seus olhos. Ela olhou para Ricardo, que lhe deu um aperto gentil e tranquilizador no ombro.
"Eu sou a noiva dele", ela anunciou, as palavras ecoando no corredor silencioso, estilhaçando os últimos vestígios do meu mundo despedaçado em pedaços irreparáveis. "Nós vamos nos casar."