As chamas lambiam as paredes da minha casa, o calor era insuportável. Eu segurava minha filha, Clara, com força contra o peito. O choro fraco dela era a única coisa que importava no meio do caos. Eu gritava, batendo na porta do quarto trancada: "Isabela! Abra a porta! Por favor!" . Do outro lado, ouvia apenas o silêncio dela. O fogo se aproximava, e o rosto de Clara se contorcia de medo e dor. Foi então que a voz dela veio, fria e desprovida de qualquer emoção. "Se não fosse por vocês duas, Gabriel não teria morrido." Cada palavra era uma sentença de morte. "Todos os dias desde que ele se foi, eu me sinto como um zumbi. Eu já queria levar vocês para o túmulo dele há muito tempo!" O ódio em sua voz era palpável. O fogo finalmente nos alcançou. A imagem do sorriso de Clara desaparecendo na fumaça foi a última coisa que vi. O amor que eu senti por Isabela se transformou em cinzas, junto com meu corpo e o da minha filha inocente. Então, abri os olhos. A luz suave do abajur, o cheiro floral de Isabela. Ela estava ali, com o rosto corado e os olhos turvos de desejo, exatamente como naquela noite, dez anos atrás. "Luana..." , sua voz baixa e rouca me causou um arrepio de pavor. Não. Não de novo. Lembrei-me de tudo. Meu irmão Ricardo havia drogado Isabela. Ele a jogou na minha cama, forçando-me a ser sua "cura" . Na vida passada, eu cedi, e o resultado foi um casamento forçado e uma morte horrível em um incêndio provocado pelo ódio dela. Desta vez, não. Minha voz saiu mais firme do que eu esperava: "Não me toque." Eu sabia que precisava quebrar aquele ciclo de tragédia.