A luz branca do hospital era fria. O meu corpo doía, mas a minha barriga, antes redonda, estava estranhamente leve. O meu filho, Tiago, um prematuro, lutava na UTI neonatal. Quando agarrei no telemóvel, o meu marido, Miguel, atendeu com uma voz distante e irritada. "O que foi, Clara? Estou ocupado." Ele justificou a sua ausência crucial com a "crise de pânico" da prima Sofia. Mas ao fundo, ouvi a voz dela, nada em pânico, a perguntar sobre pizza. A minha sogra, Beatriz, ligou apenas para me culpar pelo parto prematuro e pelo "desgosto" de Miguel e Sofia. Eu, que mal conseguia respirar, vi-me acusada de tudo. A gota d' água veio quando descobri que a sua alegada "emergência no trabalho" que o impedia de estar com o nosso filho era, afinal, cocktails caros com Sofia, posando para fotos em redes sociais. Tantas vezes fui a "forte", a que "entende", a que "aguenta". Mas a indiferença gélida dele, a priorização da sua "alma gémea platónica", e a farsa familiar em torno do meu sofrimento, foram demais. Como ele podia ser tão cego, tão cruel? A minha dor transformou-se em clareza amarga: ele nunca mudaria. Então, no dia da alta de Tiago, enquanto tentavam encenar a "família feliz" no corredor do hospital, entreguei-lhes os papéis do divórcio e da guarda exclusiva do meu filho. O meu caminho estava traçado. A minha libertação começou com os gritos dela e as lágrimas dela. E esta é a história de como encontrei a minha força.