*CINCO ANOS DEPOIS*
Benson olhava para o grupo de crianças brincando dentro das grades do jardim de infância. Quatro anos haviam passado e as lembranças daquela noite nunca foram tão vívidas.
A mulher debaixo dele tinha lágrimas nos olhos, devido ao ato praticado e a força que ele exercia sem conseguir se controlar - efeitos da droga que lhe deram -, tomando tudo dela. Cada vez que se lembrava disso, Benson sentia nojo de si mesmo. E dela. Ela armou tudo aquilo, o humilhou e, agora, ele descobria que tinha um filho.
A luz do Sol batia no rosto dele, tornando-lhe as feições indistinguíveis a uma certa distância, mas era possível notar como ele era alto, elegante, e com um físico invejável. O tecido nobre do paletó só enfatizava a boa figura dele.
"Senhor, iremos levar o jovem mestre para casa agora?" perguntou assistente, Patrick Dixon.
Benson sacudiu a cabeça, as mãos dentro dos bolsos da calça.
"Amanhã faremos isso. Tenho assuntos a tratar, hoje."
O som dele era baixo e magnético, completamente desprovido de emoção.
"Sim, Sr. Wingrave."
Benson desviou o olhar das crianças e caminhou de volta para seu Bentley, entrando no carro. Pouco depois, o veículo partiu, deixando poeira no ar.
*** ***
No dia seguinte, um garoto se destacava das outras crianças no jardim de infância. Ele tinha os olhos verdes impressionantes, contrastando com cabelos muito escuros e um nariz reto. Suas bochechas rosadas lhe conferiam um ar formidável. Ele amarrou o sapato e voltou a correr com as outras crianças, porém nem cinco minutos tinham se passado e ele acabou pisando sem querer no pé de outro menino, Paul.
"Ah! Meu pé!" o menino gritou, jogando-se no chão e reclamando.
"Caramba, Paul, me desculpa!", Attikus pediu sinceramente, porém, Paul o olhou com desprezo e se levantou, apenas para empurrar Attikus com força.
"Como ousou pisar no meu pé? Eu vou mandar meu pai te dar uma surra!"
O pai de Paul era um funcionário do exército, possuía uma alta patente e, sabendo disso, o orgulhoso e arrogante Paul se valia da informação para se colocar acima dos colegas de classe.
Outro menino se aproximou e reclamou.
"Paul, o Attikus já pediu desculpas. Por que você ainda está implicando com ele?"
Paul bufou.
"Ele pisou em mim! Tudo o que eu quero é que meu pai o mate!" Paul cuspiu no chão, aos pés de Attikus. "Garotos sem pai como ele merecem apanhar e morrer!"
A expressão de Attikus mudou imediatamente.
"Quem você disse que não tem pai?"
"Quem mais, senão você? Todo mundo aqui sabe que Attikus Hanson não tem pai! Você é um bastardo!"
Attikus encarou Paul por alguns segundos antes de correr até o garoto. Os dois caíram no chão, se embolando.
"A professora está vindo! A professora está vindo! Attikus Hanson bateu em alguém!"
*** *** ***
Lauryn estava no serviço quando alguém lhe chamou e avisou que tinha uma ligação para ela.
"Obrigada!", ela falou e pegou o telefone. "Lauryn Hanson falando!"
"Senhorita Hanson, precisamos que venha imediatamente até a escola. O seu filho bateu em outra criança!"
Lauryn não acreditava naquilo. Attikus era sempre um bom menino, por que continuava a brigar na escola? Ela não discutiria por telefone, apenas avisou que tinha que sair, pegou suas coisas e correu para pegar um táxi.
Attikus era uma criança tão doce e atenciosa, mas por algum motivo, de vez em quando ele se metia em brigas no jardim de infância. Geralmente... algo relacionado ao fato de ele não ter um pai presente. Aquele era um espinho no coração de Lauryn, que ela não conseguia arrancar. Ela só podia rezar para que os anos passassem e o menino compreendesse melhor.
Quando o carro parou no sinal vermelho, Lauryn suspirou e seus olhos vagaram para a TV na vitrine de uma loja de eletrônicos. Lá, estavam falando sobre um magnata e sua empresa.
"O Grupo Wingrave está comemorando seu vigésimo aniversário. Esta é a empresa que se tornou, nos últimos anos, o maior nome da tecnologia, e o presidente Benson Wingrave contribuiu muito para isso..."
A imagem de um homem bonito, com olhos verdes tão claros que podiam ser vistos mesmo à distância. Seus traços eram perfeitos: maxilar anguloso e forte, nariz reto, lábios masculinos levemente carnudos, sobrancelhas arqueadas, olhos naturalmente semicerrados e um corpo forte, o que era possível notar mesmo sob o terno feito sob medida.
Lauryn sentiu como se pudesse se perder naqueles olhos, que a sugavam como um vórtice. Mas ela desviou o olhar da TV. Algumas pessoas nascem destinadas a serem grandiosas e arrogantes. Ela, por outro lado, era apenas uma pessoa comum. E uma jamais teria qualquer relação com a outra, mesmo que tivessem vivido uma noite de amor ardente quatro anos antes.
Aquele homem foi o primeiro e único dela e as lembranças daquela noite ainda a atormentavam. Não foi escolha dela, nem dele, mas aconteceu. E, no meio do caminho, não era mais apenas dor, mas também prazer. A forma como o homem a beijava e a tomava, gravados na mente dela. Lauryn nunca se relacionou com ninguém depois dele.
O carro voltou a andar e Lauryn buscou voltar ao presente.
Na escola, a professora de Attikus estava com uma expressão de cansaço. Ela gostava muito do menino e se preocupava com ele.
"Senhorita Hanson, se fosse outra criança, eu lhe afirmaria que os pais ouviriam e entenderiam o que houve. Mas os Reeves são difíceis. Eles virão à escola amanhã, então, precisa prestar atenção."
"Obrigada, senhorita Clarke." Lauryn disse à gentil professora, levantando-se e saindo com Attikus.
No caminho de volta, Lauryn perguntou o motivo da briga. Como ele permaneceu em silêncio, Lauryn se agachou em frente a ele.
"Amor, por que você sempre briga lá? Você é uma criança tão boa e obediente. Você faz ideia de como isso parte meu coração?"
"Desculpa, mamãe," o menino disse e abaixou a cabeça. Ele estava arrependido por deixar a mãe triste, porque tudo o que queria era que ela sentisse orgulho dele!
"Tudo bem... só lembre de pedir desculpas ao Paul aman-"
"Eu não vou pedir desculpas!" Ele interrompeu a mãe. "Eu não vou pedir desculpas pra ele nem que isso me mate!"
Os olhos do menino estavam cheios de orgulho e ele estava claramente determinado. auryn suspirou pesadamente.
"Attikus, você bateu no garoto primeiro e mesmo depois de conversarmos, você mantém essa atitude? E não se esqueça de que o pai de Paul é um funcionário de alto escalão."
O menino era jovem demais para entender a gravidade da situação. Lauryn era uma mulher e, mesmo depois de o mundo ter mudado tanto, mulheres ainda eram vistas como inferiores - e uma mulher com um filho e sem marido, pior ainda.
"É que... eles sempre me chamam de bastardo. Bastardo porque eu não tenho pai!"
Ele sabia que sua mãe trabalhava duro para alimentar os dois e garantir um teto sobre suas cabeças. Ela sempre chegava tarde do trabalho e ele não queria que ela se preocupasse. Por isso não contou a verdade de imediato. Mas ele não estava aguentando mais. As outras crianças sempre diziam aquelas palavras cruéis e, de fato, ele não tinha pai.
O corpo de Lauryn ficou paralisado e o sangue pareceu subir todo à cabeça, fazendo-a sentir-se fraca e enxergar pontos escuros diante dos olhos. Ela quase caiu, mas o pequeno corpo a ajudou a continuar de pé.
"Mãe, me desculpa! Eu não devia ter dito isso!" Ele jamais queria ver a mãe sofrer.
Ela se agachou e abraçou o filho. Aqueles últimos cinco anos tinham sido muito difíceis para ela, mas sempre tentou manter a cabeça erguida e não derramar uma lágrima. Mas naquele momento, ela não conseguiu mais segurar.
"Sou eu quem deve pedir desculpas, amor. Sou eu quem deve se sentir culpada, não você."
Ela abraçava o menino com força e soluçava enquanto chorava. Ele era tudo para ela.
Quando descobriu que estava grávida depois daquela noite, ela decidiu abortar a criança. Mas quando já estava dentro da sala de cirurgia, não conseguiu. Era uma vida. Era o filho dela! No momento, ela não pensou em como a sociedade trataria a criança. Ela acreditou que o amor dela fosse o suficiente para protegê-lo, mas a cada dia, ela percebia que não. No entanto, não se arrependia de ter aquela criança incrível.
No dia seguinte, Benson estava tomando sua xícara de café e olhava para o jardim, não dando atenção às duas mulheres em frente a ele; a mãe e a avó.
"Benson, você precisa trazer a criança para esta casa o mais rápido possível. Sabe que o seu avô está doente e ele precisa ver o menino para poder ficar em paz!" Valeria Wingrave falou, aborrecida.
"Não se preocupe, vó. Cuidarei disso."
"E é claro que a mãe do menino deve acompanhá-lo," Diara falou e olhou para o filho. "Ele não nos conhece, e nem a essa casa. Vai se sentir mais seguro e aberto a nós se ela estiver por perto."
Valeria soltou o ar com desprezo. Ela odiava Lauryn Hanson, a mulher que armou para arrancar dinheiro dos Wingrave com aquela noite armada e fotos!