A voz do meu pai ecoava na minha cabeça, como sempre. Ele podia estar morto, mas ainda era capaz de me atormentar.
Passei a mão pelo nó da gravata, só para garantir que estava no lugar. Era um gesto automático, quase um escudo. Eu precisava parecer inabalável. O problema é que, por dentro, a tempestade já estava armada.
As portas se abriram, e pronto. O ar pareceu ficar ainda mais pesado.
Ele entrou.
Lucas Hart.
Meu meio-irmão.
O fantasma que o velho Cooper sempre tentou enterrar, mas que agora caminhava vivo e sorridente, com aquele ar de "eu pertenço a esse lugar". Ele não precisava dizer nada. Só o simples fato de estar ali já era uma provocação.
- Senhores - ele começou, a voz firme, confiante demais para quem sempre viveu às sombras. - Está na hora de reconhecer o meu lugar legítimo na Cooper Enterprises.
Os olhares se cruzaram em volta da mesa, alguns com surpresa, outros com aquela dúvida maldita que eu mais temia. Lucas tinha esse dom: aparecer feito uma bomba-relógio e plantar discórdia com um simples sorriso.
Mantive a postura, mas por dentro minha raiva queimava.
- Você não tem direito a nada - falei, a voz fria, cortante. - Meu pai nunca te reconheceu.
Ele riu. Um riso baixo, debochado, como quem já tem a vitória na mão.
- Talvez não em vida. Mas a verdade sempre aparece, maninho. E, acredite, eu não tenho pressa.
Quis socar aquele sorriso da cara dele. Mas não. Eu não podia. Não ali, não diante de todos. O jogo era de xadrez, não de socos.
E foi nesse clima que meu tio Curt, sentado alguns lugares atrás, se levantou.
-Você Lucas, a menos que tenha alguma coisa muito importante a falar e não só palavras ao vento se retire por favor!
Por um segundo, achei que ele fosse colocar Lucas para fora da sala, esmagar aquela tentativa ridícula de golpe. Mas não. O ardiloso do meu meio-irmão saiu e o olhar de tio Curt veio direto para mim.
- Ethan, precisamos conversar. - Ele não falou para a sala inteira. Foi para mim. Só para mim. Baixo, firme, num tom que não deixava espaço para "não". - Agora.
Ele fez um sinal discreto para os outros continuarem com os relatórios e me puxou para fora, pelo corredor comprido que levava aos escritórios privados. O som abafado das vozes da reunião ficou para trás, mas a sensação de que eu estava prestes a ser atingido por um raio só aumentava.
Fechamos a porta da sala dele, e foi como se o mundo lá fora tivesse sumido.
- Vai direto ao ponto, tio. - Cruzei os braços, já cansado de rodeios. - O que você quer?
Ele se apoiou na mesa, respirou fundo e me encarou daquele jeito sério que só ele tinha. - Lucas está ganhando terreno. E se você não se adiantar, vai perder tudo.
- Eu sei disso. - Minha voz saiu mais áspera do que eu pretendia. - Mas eu vou achar uma forma de manter o império.
- Já existe uma forma. - Ele estreitou os olhos, como se a resposta fosse óbvia. - Está no testamento do seu pai.
Aquilo me fez gelar. Eu odiava quando traziam o velho para a conversa, como se ele ainda tivesse o poder de manipular minha vida mesmo morto.
- Não começa, tio. - Levei a mão à nuca, tentando aliviar a tensão. - Você sabe que aquele testamento foi uma piada de mau gosto.
Ele não recuou.
- Não é piada, Ethan. É lei. E está claro: você só assume o controle definitivo da Cooper Enterprises se for casado.
Eu ri. Um riso seco, sem humor.
- Casamento? É sério isso? O mundo desmoronando, Lucas tramando pelas costas, e você vem me dizer que a solução mágica é colocar uma aliança no dedo?
- Não é mágica - ele rebateu, firme. - É estratégia. Os investidores querem estabilidade. Querem acreditar que você é um homem de família, alguém confiável, que inspira segurança. Isso vale mais do que qualquer discurso seu em sala de reunião.
Fiquei em silêncio por um instante, tentando digerir. Casar. Essa palavra soava como prisão. Eu poderia lidar com números, dívidas, concorrência desleal, mas casamento? Isso estava em outro nível.
- Eu não vou me casar com qualquer uma só para agradar um bando de acionistas - respondi, a voz mais baixa, mas carregada de veneno. - Não sou um boneco obedecendo um testamento.
Meu tio se aproximou, apontando o dedo para mim.
- Então prepare-se para entregar tudo o que seu pai construiu de bandeja para Lucas.
Fechei os olhos por um instante, sentindo o peso da escolha se instalar sobre meus ombros. Era sufocante.
- Você já tem alguém em mente, não é? - perguntei, sem paciência para adivinhações.
Curt soltou um meio sorriso, satisfeito.
- Clarisse Moore. Jovem, educada, de boa família. A neta da senhora Abigail. Perfeita para esse papel.
Rolei os olhos, bufando.
- Já estive com Clarisse. E acredite, ela é perfeita para muitas coisas... mas não para ser minha esposa.
Ele me encarou, desapontado.
- Ethan, você precisa parar de agir como se isso fosse opcional.
- Eu vou resolver - garanti, mesmo sem ter ideia de como. - Mas não do jeito que você quer.
Curt suspirou, jogando-se na poltrona.
- Só não demore. Cada dia perdido é uma vitória a mais para Lucas.
Saí da sala dele com a cabeça latejando. O corredor parecia mais longo do que nunca, e a sombra de Lucas ainda queimava na minha mente.
Casar. Eu com 30 anos ainda não pensava em casar, não agora. Era isso. A última cartada do velho Cooper para me manter sob as rédeas, mesmo do além.
Eu podia enfrentar uma guerra de acionistas. Podia lidar com meu irmão bastardo tentando roubar meu lugar.
Mas casamento?
Isso... isso era outro tipo de batalha.
E a pergunta que não saía da minha mente enquanto voltava para a sala de reuniões era:
Quem, diabos, seria a mulher capaz de salvar não só a Cooper Enterprises... mas também a minha sanidade?
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