Meu mundo se estilhaçou. Cada gesto de carinho, cada promessa sussurrada, cada sonho compartilhado... tudo era uma mentira. Ele me deixou ali, paralisada, e correu para encontrar Kíria, que estava chorando no Parque Ibirapuera.
Lá, escondida, ouvi a traição final: "Eu nunca amei a Elisa. Eu a conquistei por você. Eu precisava que ela gerasse nosso filho para que você não precisasse pausar sua carreira." O bebê que eu perdi em um aborto espontâneo não era nosso; era de Kíria, concebido com o sêmen de um doador.
Eu fui apenas um recipiente, uma barriga de aluguel involuntária. Para piorar a humilhação, descobri que eu era a verdadeira herdeira dos Bittencourt, uma verdade que Dante e Kíria conspiraram para esconder a fim de proteger a herança dela.
Eles até tentaram me matar, me empurrando para uma piscina, com Dante escolhendo salvá-la em vez de mim.
Capítulo 1
Dante Lobo não acreditava em casamento.
Ele dizia que era um contrato, um pedaço de papel que sufocava a verdadeira conexão. O amor, ele afirmava, deveria ser livre e sem amarras.
Eu acreditei nele.
Eu era Elisa Castro, uma bailarina prestes a iniciar uma carreira no Teatro Municipal de São Paulo. Abri mão de tudo por ele. Internalizei sua filosofia, tornando-a minha. Nosso amor era superior, eu pensava, mais puro do que qualquer voto ou anel poderia torná-lo.
Eu estava em Belo Horizonte há uma semana, visitando uma antiga mentora da época em que vivi em um orfanato. Terminei minha visita dois dias antes e decidi voar de volta para São Paulo para surpreendê-lo. Imaginei a expressão em seu rosto, o sorriso lento se espalhando por seus lábios quando me visse parada na porta.
A festa estava a todo vapor em sua cobertura. A música vazava para o corredor enquanto eu entrava com minha chave. Naveguei pela multidão, procurando por ele. Encontrei-o na varanda, de costas para mim, conversando com um amigo. Sorri, pronta para abraçá-lo pela cintura.
Então ouvi suas palavras, carregadas pela brisa fria da noite.
"É claro que vou me casar com ela. Kíria é a única para mim."
Meus pés congelaram no piso de mármore. Minha surpresa morreu na garganta.
O amigo riu. "E a dançarina, a tal da Elisa? Você está com ela há dois anos. Todo mundo acha que é sério."
A voz de Dante era desdenhosa, gélida. "A Elisa? Ela é só um tapa-buraco. Kíria e eu temos esse acordo desde que éramos crianças. Sempre seria ela."
"Então, qual é o plano?", perguntou o amigo. "Você não pode simplesmente largar a Elisa. Vai pegar mal."
"Não se preocupe", disse Dante, e sua voz estava carregada de uma arrogância arrepiante. "Ela já cumpriu seu propósito. Ela sabe o lugar dela. Não vai fazer escândalo."
Meu coração parecia ter parado. O sangue sumiu do meu rosto e um zumbido começou em meus ouvidos. Os sons da festa se transformaram em um ruído surdo.
Eu não conseguia respirar. Cada gesto de carinho, cada promessa sussurrada, cada sonho compartilhado... tudo era uma mentira. Uma performance cuidadosamente construída.
Meu corpo inteiro começou a tremer. A taça de champanhe que eu tinha pegado escorregou dos meus dedos dormentes e se estilhaçou no chão. O barulho foi ensurdecedor no silêncio repentino do meu mundo.
Eu lutava para entender. O homem que me abraçava à noite, que me dizia que eu era seu mundo, que me convenceu a desistir do meu futuro pelo nosso futuro... ele era um estranho.
Naquele exato momento, seu celular tocou, um som agudo e invasivo.
Ele atendeu, seu tom mudando instantaneamente. Estava suave, cheio de uma emoção desesperada que eu nunca tinha ouvido dele antes.
"Kíria? O que foi? Onde você está?"
Houve uma pausa. Eu podia ouvir o som fraco e frenético da voz de uma mulher do outro lado.
"Não faça nenhuma besteira", disse Dante, a voz tensa de pânico. "Fique aí. Estou indo. Estou indo agora mesmo."
Ele desligou e se virou, o rosto uma máscara de puro terror. Ele ia correr, correr atrás dela, o verdadeiro objeto de seu afeto.
Ele não me viu a princípio. Apenas começou a se mover, empurrando o amigo.
"Dante", consegui sussurrar, minha voz falhando.
Ele finalmente me notou. Mal olhou para o meu rosto, seus olhos já focados na porta. Ele esbarrou em mim, me empurrando para o lado sem pensar duas vezes. Meu ombro bateu no batente da porta, uma dor física aguda que não era nada comparada à agonia em meu peito.
"Foi mal", ele murmurou, uma palavra vazia, sem importância. Ele não parou. Não olhou para trás.
Todo o seu ser estava focado em uma coisa: chegar até Kíria.
Seu amigo olhou das costas de Dante para a minha expressão devastada. Ele se aproximou de mim, com um olhar de pena no rosto. "Elisa, você está bem?"
Tentei me recompor, construir um muro ao redor da ferida aberta em meu coração.
"Estou bem", eu disse, a mentira com gosto de cinzas na minha boca. "Lembrei que esqueci uma coisa na casa de uma amiga. Preciso voltar."
Forcei minhas pernas a se moverem, a sair com alguma aparência de dignidade. Saí da cobertura, saí da vida que eu pensava ser minha.
As portas do elevador se fecharam e a máscara que eu usava desmoronou.
Deslizei pela parede, enterrando o rosto nas mãos enquanto uma onda de soluços que rasgavam minha alma me atravessava. O corredor frio e estéril tornou-se a testemunha da destruição completa e absoluta do meu mundo.