A Virada Do Destino Na Festa
Contos Como uma bomba, a notícia explodiu na festa mais luxuosa da cidade.
Eu estava lá, Sofia Mendes, a estilista do momento, a "filha da sorte" que saiu do orfanato para o topo, exibindo meu vestido de alta-costura e uma barriga de cinco meses de gravidez.
Então, a tela gigante mudou para um noticiário urgente: "Escândalo de troca na maternidade abala a alta sociedade! Sofia Mendes não é a verdadeira herdeira da família Costa. A verdadeira filha, Isabella Costa, viveu uma vida de dificuldades."
O silêncio foi cortado por sussurros, e os olhares se voltaram para mim, não mais de admiração, mas de pena, desprezo.
Meu sorriso congelou. Minha identidade, minha história, tudo foi arrancado de mim em um instante.
Senti o chão sumir, a mão instintivamente protegendo meu filho do desastre que caía sobre nós.
Procurei meu marido, Ricardo Silva, meu porto seguro.
Ele não estava ao meu lado.
Eu o encontrei em um canto escuro, perto da saída de serviço, de costas para mim, falando ao telefone. Sua voz, geralmente tão calma e amorosa, estava diferente, fria e cortante.
"O leilão está pronto, Isabella. Não se preocupe."
Uma pausa.
"Sim, o prêmio principal é a vida dela. Cada detalhe. A humilhação pública, a falência, a destruição de tudo o que ela construiu."
Outra pausa, e a frase seguinte fez meu sangue gelar.
"O bebê? Claro que está incluído. Isso torna tudo mais... valioso."
Isabella. A verdadeira herdeira. Sua amiga de infância.
Leilão. Prêmio. Valioso.
As palavras giravam na minha cabeça, sem fazer sentido, mas ao mesmo tempo formando a mais terrível das verdades.
Ricardo, o homem que me apoiou quando a primeira suspeita da troca de bebês surgiu, o homem que prometeu me amar não importava o meu sangue, estava vendendo a minha vida. E a vida do nosso filho.
Ele desligou o telefone e se virou. Quando me viu, seu rosto mudou instantaneamente. A frieza desapareceu, substituída pela máscara de preocupação.
"Sofia, meu amor! Eu estava te procurando! Você está bem?"
Ele veio até mim, tentando me abraçar. Eu recuei, meu corpo todo tremendo.
"Não toque em mim."
Sua expressão vacilou por um segundo.
"Querida, eu sei que é um choque. Mas nós vamos passar por isso juntos. Eu estou aqui."
Ele me ofereceu um copo de água, a mesma mão que segurava o telefone enquanto negociava minha ruína. O gesto era tão falso, tão calculado, que senti vontade de vomitar.
O caminho para casa foi um silêncio pesado, quebrado apenas pelo som do motor do carro de luxo. Eu olhava para o perfil de Ricardo, o pai do meu filho, e via um completo estranho. Um monstro.
Eu precisava ter certeza. Precisava ouvir da boca dele.
"Ricardo", minha voz saiu fraca, rouca.
"Sim, meu amor?"
"O que vai ser de nós agora? Eu... eu não sou mais ninguém."
Ele esticou a mão e pousou sobre a minha, mas seu toque era como gelo.
"Não diga isso. Você é Sofia Mendes, minha esposa. Para mim, nada mudou. Eu te amo pelo que você é, não pelo sobrenome que você carregava."
As palavras eram perfeitas, ensaiadas. Exatamente o que uma mulher em pânico gostaria de ouvir.
"E a Isabella?", perguntei, o nome dela arranhando minha garganta.
Ele hesitou. Foi só por um segundo, mas eu vi.
"Ela... ela sofreu muito, Sofia. É justo que ela tenha o que é dela por direito. Vou ajudá-la a se restabelecer."
"Ajudá-la... com o quê?", insisti.
"Com tudo o que ela precisar. Ela é a vítima aqui, não podemos esquecer disso."
A vítima. E eu era o quê? A usurpadora? A impostora que merecia ser leiloada no mercado negro?
Ah, que tola fui! Não era amor, era a construção cuidadosa de uma obsessão doentia.
Ele atendeu, e sua voz se encheu de uma ternura que ele nunca usou comigo.
"Bella? Onde você está? Calma, não chore. Eu estou indo aí agora. Fique onde está."
Ele desligou e pegou as chaves do carro novamente.
"Ricardo, você vai me deixar aqui? Sozinha? Agora?", eu perguntei, a incredulidade me sufocando.
Ele me olhou, e pela primeira vez, não havia máscara. Havia apenas frieza e impaciência.
"Isabella precisa de mim. Você vai ficar bem. Descanse."
Ele se virou e saiu, batendo a porta atrás de si. Nem um olhar para trás.
Ele foi consolar a "vítima", deixando a "impostora" grávida para trás, sozinha na casa vazia, com a verdade esmagadora de sua traição.
Sozinha na imensidão da sala, o silêncio era um zumbido nos meus ouvidos.
Meu celular vibrou. Uma mensagem de um número desconhecido.
A imagem me atingiu como um soco: Ricardo e Isabella em um abraço íntimo, um carinho que ele nunca me deu.
Abaixo, a legenda: "O lugar que nunca foi seu."
A bile subiu pela minha garganta. O ar me faltou.
A dor aguda e lancinante atravessou meu ventre.
Gritei.
Caí de joelhos, as mãos sobre a barriga.
"Não... por favor, não..."
O mundo girou, as luzes se transformaram em borrões e a escuridão me engoliu.
Acordei com o cheiro de antisséptico e o som baixo de um monitor cardíaco.
Estava em um quarto de hospital.
Ouvi a voz de Ricardo no corredor, ao telefone. A mesma voz fria e calculista.
"O incidente desta noite não muda nada. Apenas aumenta o interesse. Sim, ela desmaiou. Estresse. O médico disse que a gravidez é de risco agora."
Uma pausa. Ele riu, um som baixo e sem humor.
"Claro que o preço sobe. Uma mulher grávida e frágil? Isso adiciona um tempero dramático que seus compradores vão adorar. O pacote 'mãe e filho' está mais atraente do que nunca."
Meu coração parou. Ele não estava apenas me vendendo. Ele estava usando a fragilidade do meu filho, do nosso filho, para aumentar o preço do meu sofrimento.
Ele entrou. A máscara de preocupação estava de volta.
"Meu amor, você acordou! Que susto você me deu. O médico disse que você e o bebê precisam de repouso absoluto."
Ele se aproximou da cama e tentou tocar meu rosto. Eu virei a cabeça.
"Fique longe de mim", sibilei.
Ele suspirou, um som teatral.
"Sofia, você está confusa, abalada. É normal. Mas eu estou cuidando de tudo."
Nesse momento, um médico e uma enfermeira entraram.
"Senhora Mendes, que bom que acordou. Tivemos que trazê-la às pressas. Foi um pico de estresse muito perigoso", disse o médico.
"Eu quero ir embora", falei. "Eu quero ir para outro hospital."
Ricardo interveio, sua mão no ombro do médico.
"Doutor, minha esposa está claramente traumatizada. Ela não está pensando com clareza. Eu sou o responsável por ela. Acho que um calmante seria o melhor, para ela poder descansar de verdade."
"Não! Eu não quero calmante nenhum!", protestei.
A enfermeira já se aproximava com uma seringa.
"É só para ajudá-la a relaxar, senhora", ela disse com uma voz suave.
"Eu não preciso relaxar! Eu preciso sair daqui! Ele é perigoso!", gritei.
Mas o olhar do médico era profissional e distante. Para ele, eu era apenas uma paciente histérica.
A enfermeira segurou meu braço. Eu tentei puxar, mas estava fraca demais. A agulha perfurou minha pele.
O líquido gelado entrou na minha veia, e o quarto começou a girar novamente.
Minha última visão, antes de a escuridão me levar, foi o rosto de Ricardo. O sorriso dele não era de alívio. Era de triunfo.
"Eu vou sair daqui, Ricardo", consegui sussurrar. "E você... você vai pagar por isso."
Ele se inclinou sobre mim, seu hálito quente no meu rosto.
"Você não vai a lugar nenhum, Sofia", ele disse. "Você é minha. E agora, você vai descansar."
Ele se endireitou e caminhou até a porta.
O som da porta batendo ecoou na minha mente enquanto eu afundava na inconsciência forçada. Eu era uma prisioneira.
Eu só tinha uma pessoa.
Professora Ana Lúcia. Minha mentora. A única figura materna que eu tive. Ela era forte, influente e, o mais importante, ela nunca gostou de Ricardo.
Eu precisava de um telefone.
Passei o dia fingindo estar calma, dócil, resignada.
"Eu me sinto um pouco melhor", menti para ela à tarde. "Eu poderia... poderia usar o telefone por um minuto? Só para ligar para o orfanato, para avisar a diretora que estou bem. Ela se preocupa comigo."
A enfermeira hesitou, mas meu olhar suplicante e minha barriga de grávida a convenceram.
"Só um minuto, e não diga que eu deixei", ela sussurrou, me entregando o telefone sem fio do posto de enfermagem.
Minhas mãos tremiam enquanto eu discava o número que sabia de cor.
"Alô?" A voz de Ana Lúcia era inconfundível.
"Professora, sou eu", sussurrei. "Sofia."
"Sofia! Querida, eu vi as notícias. Onde você está? Eu tentei te ligar..."
"Não tenho tempo", interrompi. "Ele me prendeu. Ricardo. Estou no Hospital Santa Mônica, quarto 302. Ele está me drogando. Ele... ele fez uma coisa horrível."
Houve um silêncio. A voz de Ana Lúcia voltou, firme como aço.
"Sofia, ouça com atenção. Não reaja. Não discuta com ele. Apenas finja. Eu vou te tirar daí. Você confia em mim?"
"Sim", respondi, as lágrimas finalmente escorrendo.
"Bom. Eu tenho contatos. Vou resolver isso. Apenas aguente firme. Estou a caminho."
Devolvi o telefone à enfermeira com um agradecimento silencioso. Pela primeira vez, uma pequena chama de esperança se acendeu em mim.
Naquela noite, eu não consegui dormir.
E foi então que eles vieram.
Duas silhuetas masculinas, grandes e ameaçadoras, entraram no quarto.
Uma mão áspera cobriu minha boca. Outra pressionou um pano sobre meus olhos.
Senti meu corpo ser levantado com força. Eu me debati, mas era inútil. Meus braços foram presos.
Uma picada aguda. Outra agulha.
O mundo começou a se dissolver.
Acordei com um cheiro de mofo e umidade. Minha cabeça doía.
Eu estava sentada em uma cadeira de madeira dura, minhas mãos e pés amarrados. O pano ainda estava sobre meus olhos.
"Olha só quem acordou. A princesinha."
A voz era oleosa, cheia de um prazer cruel.
Alguém arrancou o pano dos meus olhos. A luz fraca me cegou.
Quando meus olhos se ajustaram, vi um homem parado na minha frente. Ele era gordo, com o cabelo ralo e um sorriso de dentes amarelados.
"Bem-vinda, Sra. Mendes. Ou devo dizer, a impostora?", ele zombou. "Parabéns. Seu marido é um homem de palavra. Eu dei o maior lance no leilão dele. E mal posso esperar para começar a 'arruinar' sua vida."
Meu estômago se revirou. Então era isso. O leilão tinha acontecido. Eu era o prêmio.
"Quem é você?", perguntei, a voz trêmula.
"Ah, você não se lembra de mim? Marco. Marco Abreu. Meu ateliê de design faliu há cinco anos. Uma pequena empresa que seu querido marido fez questão de esmagar para abrir caminho para a sua marca. Agora, é a minha vez de me divertir."
Ele se aproximou, seu hálito azedo me atingindo.
O pânico tomou conta de mim. Eu olhava para os cantos escuros, procurando desesperadamente por uma saída.
E então, eu vi.
No canto superior da parede, quase escondida, uma pequena luz vermelha piscava.
Uma câmera.
Meu coração congelou.
Ricardo não tinha apenas me vendido. Ele não tinha apenas me entregado a um inimigo para ser torturada.
Ele estava assistindo.
Ele estava em algum lugar seguro e confortável, talvez com Isabella, assistindo a tudo em tempo real, como um filme doentio. A humilhação, o medo, a dor... tudo era parte do espetáculo que ele havia orquestrado.
Aquele pequeno ponto vermelho era mais aterrorizante do que o homem à minha frente. Era a prova final da profundidade de sua depravação.
O terror se transformou em fúria.
A imagem de Ricardo assistindo me acendeu. Eu não ia ser um espetáculo para ele. Eu não ia dar a ele essa satisfação.
"Me solta!", gritei. A corda cortava, mas eu não sentia a dor.
Marco Abreu riu.
"Gritando? Ótimo. Isso torna tudo mais emocionante. Seu marido disse que você tinha fibra. Vamos ver quanto tempo dura."
Ele pegou uma cadeira e se sentou na minha frente. Ele começou a descrever, com detalhes gráficos, o que pretendia fazer comigo.
Mas eu não estava mais ouvindo ele. Eu estava olhando para a câmera. Eu estava falando com Ricardo.
Você não vai vencer, pensei. Eu não vou deixar.
Eu precisava acabar com aquilo. Precisava parar o "show".
E só havia uma maneira.
Se o prêmio era eu, e o "pacote mãe e filho" era o que o tornava mais valioso, então eu tinha que estragar a mercadoria.
Meu olhar varreu o chão sujo. Cacos de vidro, pedaços de madeira, lixo. Nada que eu pudesse alcançar.
Minha mente correu. A cadeira. Era de madeira, velha.
Com um esforço violento, joguei meu peso para o lado. A cadeira balançou. Marco se levantou.
"O que você está fazendo, sua louca?"
Eu ignorei-o. Joguei meu corpo para o outro lado, e de novo, com mais força. Com um estalo, uma das pernas da cadeira se quebrou.
Eu caí no chão com um baque surdo, a cadeira quebrada ainda amarrada às minhas costas. A dor explodiu na minha anca e no meu ombro, mas eu a ignorei.
A queda deixou um pedaço pontiagudo de madeira da perna quebrada ao alcance da minha mão amarrada.
"Sua vadia!", Marco gritou.
Não havia tempo.
Com as mãos presas, agarrei a lasca de madeira. Era afiada.
Fechei os olhos por um instante. Pensei no meu bebê.
"Me perdoe", sussurrei.
E com um grito que rasgou minha garganta, eu cravei a ponta afiada na minha própria coxa.
A dor foi branca, ofuscante, absoluta. Um calor líquido começou a escorrer.
Marco parou, chocado.
"Você... você é louca! O que você fez?"
Eu olhei para ele, o suor escorrendo, a dor pulsando.
"O show acabou", ofeguei. "O prêmio está danificado. Seu acordo com Ricardo... acabou."
Ele olhou para o sangue, depois para a câmera, o pânico tomando conta de seu rosto.
"Droga! Droga! Ele vai me matar! O dinheiro... eu perdi o dinheiro!"
Ele começou a chutar os móveis, praguejando.
Minha consciência começou a se esvair. O chão parecia ondular.
Mas antes de a escuridão me tomar, eu ouvi vozes.
Vozes de um alto-falante conectado à câmera. A voz de Ricardo.
"Isso não fazia parte do plano, Marco! Você era só para assustá-la!"
E então, a voz de Isabella, estridente e irritada.
"Ela estragou tudo! Ricardo, ela sempre estraga tudo! E agora? E os meus pais? Você prometeu que ia me ajudar a tirá-los daquela clínica depois que essa vadia fosse destruída!"
Clínica? Meus pais?
Meus pais biológicos. Eu mal os conhecia. A notícia dizia que o choque tinha sido demais para eles, que foram internados em uma clínica psiquiátrica.
Agora a verdade me atingia.
Não foi o choque. Foi Isabella. E Ricardo. Eles os internaram para que não pudessem falar. Para que Isabella pudesse ser a única herdeira.
A briga deles continuou, saindo pelo alto-falante.
"Calma, Bella, eu vou resolver isso", dizia Ricardo.
"Resolver? Você não resolve nada! Você é fraco! Você a deixou fazer isso! Ela tem que pagar, Ricardo! E os pais dela também! Eles têm que apodrecer naquele lugar!"
A voz dela era puro veneno.
Lembrei-me da primeira vez que vi Isabella, algumas semanas antes, quando os rumores da troca começaram. Ricardo a trouxe para nossa casa.
Ela parecia tão frágil, tão quebrada. Falava em sussurros. Chorou e disse que não queria estragar minha vida.
Eu senti pena dela.
Que atriz. Que manipuladora brilhante.
E Ricardo, o diretor de todo o espetáculo.
A última coisa que senti antes de desmaiar foi o gosto amargo do sangue e da traição na minha boca. A dor na minha perna não era nada comparada à dor de saber que a trama era muito mais profunda e cruel.