Acordei no hospital, com o cheiro a desinfetante e uma barriga vazia. O monitor apitava monotonamente, ecoando o vazio dentro de mim. O médico confirmou a tragédia: perdi o meu bebé no incêndio. Liguei ao Tiago, o meu marido, em busca de conforto. Em vez disso, ouvi a voz risonha da sua prima Sofia e o miar do seu gato. Num relâmpago doloroso, percebi: ele os salvara primeiro. A eles. Não a mim. Não ao nosso filho. A frieza dele era palpável: "Estas coisas acontecem", disse, com a minha sogra Sónia a corroborar. Ela chamou-me de ingrata e louvou Tiago por salvar a "frágil" Sofia. Ele chegou a culpar o meu "drama" pessoal pela perda do nosso bebé. Como pude ser tão cega? O meu marido, o pai do meu filho, tinha conscientemente subido dois andares para resgatar a prima e um animal doméstico, enquanto eu, grávida de sete meses, lutava pela vida no fogo. Ele sabia. Ele escolheu. A dor deu lugar a uma fúria gelada e libertadora. Não mais a vítima. Olhei para ele com uma calma assustadora e disse: "Tiago, vamos divorciar-nos." Era o fim da mentira e o começo do meu renascimento. E desta vez, eu tinha as provas para desmascará-lo.
