Eu sempre amei Ricardo, o sócio mais velho de meu falecido pai, desde que me entendia por gente. Ele parecia uma figura quase paterna, mas em mim despertava um amor juvenil e intenso, alimentado por um carinho que eu sentia ser único. Contudo, numa fatídica festa da alta sociedade carioca, tudo desabou. Ricardo foi drogado, e eu, movida pela inocência e o desejo de protegê-lo, o levei para um quarto. Aquela noite, o inesperado e indesejável aconteceu, deixando-me com uma sensação profunda de impureza. A partir desse dia, minha vida virou um verdadeiro tormento. Ricardo, transformado em um homem frio e cortante, culpou-me por tudo o que desandou em sua vida. Ele me arrastou para um casamento forçado, onde as humilhações e o controle absoluto eram a rotina diária. E, o mais cruel, ele me forçou a dezoito abortos clandestinos. Cada procedimento era uma tortura, uma parte de minha alma arrancada à força, um símbolo de meu sofrimento sem fim. No décimo oitavo e último aborto, enquanto sentia a vida esvair-se, ouvi a voz gélida de Ricardo ao telefone com o médico: "Só me avise quando ela estiver morta." Como pôde o homem que eu amei, o pai que eu sonhava em ter para meus filhos, manifestar tanto ódio e indiferença? Essa frase, essa indescritível crueldade, fez-me compreender a verdadeira monstruosidade de meu carrasco. Então, veio a escuridão. E, de repente, a luz. Acordei ofegante na noite da festa, o vestido azul ainda impecável. O coração batia descontrolado. Uma segunda chance. As memórias vívidas do inferno que vivi em minha primeira vida impulsionaram-me. Eu não cometeria os mesmos erros. Minha prioridade agora era escapar do Ricardo, daquele destino cruel, e reescrever minha própria história.
