A conta do hospital chegou numa terça-feira, o peso da fatura final para o meu filho, Leo, que viveu apenas sete horas. A dor era avassaladora, mas a visão daquele envelope disparou uma lembrança gélida. O incêndio. A fumaça preta e espessa. Eu, grávida de oito meses, presa no sexto andar do nosso prédio. Liguei para o meu marido, Miguel, repetidamente, dezoito vezes, em pânico total. Quando ele finalmente atendeu, sua voz era irritada, distante: "Estou ocupado." E então ouvi a voz chorosa da sua meia-irmã, Sofia, por um tornozelo torcido. Miguel desligou, apressando-se para cuidar dela, justificando o abandono. Ele escolheu o tornozelo torcido dela em vez da vida do nosso filho e da minha. Quando pedi o divórcio, ele e o sogro me chamaram de "dramática" e "emocional". Eles pediam compaixão pela "frágil" Sofia, que manipulava a todos. A minha compaixão morreu naquele incêndio, junto com o meu filho. Mas a verdade estava nas minhas mãos. A cópia da conta. E o registo daquelas chamadas, uma prova irrefutável da sua escolha. Com a minha mãe ao meu lado, decidi: não mais vítima. Eu não estava louca, estava apenas a começar a lutar. Era hora de acertar as contas.