Parada em frente à penteadeira do meu quarto, encarei o teste digital que mudaria tudo. O resultado apareceu no visor após 3 minutos. Olhei para os outros cinco testes com a mensagem "Grávida de 2 a 3 semanas". Ergui os olhos devagar, como se o espelho pudesse confirmar o que eu me recusava a aceitar. O meu rosto estava pálido, os lábios entreabertos, o olhar perdido.
- Oh, meu Deus! - Exclamei, chocada. - Estou grávida.
Era estranho como, em um segundo, tudo o que eu imaginava para o futuro se transformou em ruínas.
A imagem do Dr. Alex veio à minha mente. Lembrei-me de quando o vi pela primeira vez no hospital. Aos dezoito anos, eu estava tentando parecer profissional com o jaleco recém-passado, mãos suadas de nervosismo. Ele entrou na sala como se o mundo parasse pra observá-lo. Ele era autoconfiante, o tipo de homem com aura de sedução que sabe exatamente o efeito que causa.
Fui mais uma das que caíram na lábia dele. Entreguei não só o meu corpo, mas uma parte do meu coração que nunca mais consegui recuperar. Depois daquela noite - a primeira da minha vida - e da vez em que transamos no escritório dele, Alex simplesmente desapareceu. Parou de atender e de responder às mensagens, como se tivesse apagado qualquer rastro meu da vida dele.
Enquanto isso, ninguém tinha tempo pra perceber que eu estava em pedaços na minha casa.
O meu pai adotivo, Gabriel Welsch, andava carrancudo desde o último escândalo em que meu meio-irmão Giovanne foi preso por assassinato e a minha meia-irmã Mellanie se tornou foragida da justiça. Os negócios da minha família estavam na lama. E a minha mãe, Viviane, tentava desesperadamente se manter firme, mesmo após ser acusada injustamente pela morte do meu pai biológico. Como se falência e toda aquela humilhação pública não fossem suficientes, ela teve que abrir mão de tudo o que construiu.
Tudo o que tínhamos era um plano de sair do país e recomeçar. Meus pais pretendiam sair do Brasil e começar uma vida nova em Portugal, longe dos flashes, dos boatos e dos julgamentos.
- Liz, o café está pronto, querida! - A voz serena da minha mãe veio do outro lado da porta.
- Já vou. - Minha voz saiu fraca.
Segurei na beirada da penteadeira quando minha vista escureceu um pouco. Esperei até me recuperar e, de repente, ouvir a porta se abrir.
- Vou marcar um médico antes da viagem - disse minha mãe do corredor, tentando soar leve, mas a exaustão estava na voz dela.
- Não precisa, mãe. Estou bem. - respondi, forçando um sorriso que não chegava nem perto dos olhos. - Só preciso avisar aos Bittencourt que não vou continuar o estágio no hospital.
Na verdade, eu precisava falar com Alex antes de embarcar naquele avião. E, sim... eu ainda achava que havia uma chance, já que a esperança tem essa mania cruel de não morrer fácil.
- Tá bem, mas come alguma coisa antes de sair. - Com aquele jeitinho doce, minha mãe pediu.
Viviane Bernardi foi minha babá quando eu tinha cinco anos... meu pai adotivo tinha me dito que ela seria a minha mãe. Todos a chamavam de "A babá do CEO" e eu era "a filha perdida" que ela tanto procurava. Nós não sabíamos que o famoso CEO Gabriel Welsch tinha unido mãe e filha que foram separadas pelo primeiro marido de Viviane enquanto ela estava em coma. Para mim, o Gabriel sempre foi o melhor pai do mundo e eu esperava que Alex fosse tão bom quanto ele.
Não vou negar que estava sentindo o coração palpitar só de pensar em como o doutor Alex reagiria quando eu contasse sobre a gravidez. Na minha mente, ele se casaria comigo e iria embora para Londres para criar o nosso filho. Animada com essa ideia fantasiosa, tentei ligar para ele outra vez, mas o número estava desligado.
- É aqui, senhorita? - perguntou o motorista, parando em frente ao edifício.
- É sim. - respondi, já abrindo a porta com pressa. - Vai ser rápido.
No elevador, ajeitei o cabelo como se isso pudesse disfarçar a palidez do meu rosto. Belisquei as bochechas, tentei sorrir pra mim mesma. Em vão.
As portas se abriram no andar dele e, por alguns segundos, fiquei parada diante com a mão estendida e com o meu coração disparado. Toquei a campainha com os dedos trêmulos conforme a minha mente viajava.
Imaginava ele me olhando surpreso, emocionado, puxando-me para dentro, dizendo que ia me apoiar, que iríamos juntos para Londres, que criaríamos nosso filho com amor. Sim, parecia um daqueles finais de um romance clichê, beirando o ridículo. Mas era nisso que eu queria acreditar.
Então a porta se abriu. E o meu mundo caiu.
Uma mulher linda apareceu. Ela era daquelas que parecem ter saído de uma capa de revista francesa. Loira, magra, alta, com cabelos em ondas suaves, olhos azul-claros, pele de porcelana. Usava um vestido de seda que abraçava cada curva. O aroma do perfume caro invadiu o corredor.
- Posso ajudar? - perguntou ela, com um sotaque francês delicado, porém frio.
Fiquei muda por alguns segundos.
"Ele voltou pra ex-noiva?" O meu cérebro estava tentando processar o que os meus olhos já tinham entendido. "Ele estava com ela esse tempo todo?"
- Eu trouxe... - tentei falar, mas a garganta fechou. - Eu trouxe isso pro Alex. - tirei a carta de demissão do bolso do casaco. Era tudo o que me restava.
Ela me olhou com uma leve inclinação de cabeça, depois sorriu.
- Claro. O Alex está no banho. - respondeu como se aquilo fosse um detalhe insignificante. - Deseja mais alguma coisa, ma chérie?
- Sim, não, - sacudi a cabeça devagar enquanto minha mente girava feito um carrossel. - Muito obrigada, senhoria - respondi com a voz murcha, quase implorando pra que ela fechasse logo a porta e me deixasse desaparecer dali.
E foi o que ela fez. Saí dali cambaleando. A esperança que eu segurava com tanto esforço desfez-se por completo.
Assim que entrei no elevador, eu desabei. As lágrimas vieram sem pedir licença. Molharam o rosto, caíram no colo, aquecendo a minha pele.
Quando cheguei ao térreo, mal conseguia enxergar direito. Um dos meus seguranças veio até mim para me acudir.
- Ele machucou a senhorita? - perguntou, franzindo a testa.
- Não, idiota! - rebati sem pensar.
Minhas pernas queriam correr, mas mal conseguia andar direito. Entrei no carro como quem se afunda num buraco.
- Vamos logo! - falei ao motorista, enxugando o rosto com a palma da mão.
Mantive o silêncio. Tentando encontrar algum resquício de dignidade dentro de mim.
A verdade? Ele me feriu muito mais do que se tivesse gritado, xingado ou até me empurrado. Alex me fez sentir como seu eu fosse um objeto usado e descartado.
"Era por isso que ele não atendia minhas ligações", pensei, olhando pela janela sem ver a paisagem. "Estava ocupado demais trepando com a francesa".
Passei a mão no rosto de novo, respirando fundo. Eu precisava me recompor. Mas como? Como continuar quando tudo que você imaginava foi destruído? Fechei os olhos por um instante e levei a mão até a barriga. Ainda não era imperceptível, mas já existia uma vida crescendo ali e um coração batendo dentro de mim.
Eu não sabia como, nem onde, encontraria forças para me reerguer.
Não pude viver um grande amor e nem mesmo tive uma linda família feliz como naqueles comercias de café da manhã de margarina.
Não tive uma rede de apoio porque escondi a minha gravidez dos meus pais. Tinha vergonha e medo de decepcioná-los assim como os meus meus irmãos fizeram.
Aos dezoito anos, eu só pensava em como criaria um filho sozinha e isso me assustava pra caramba.