Na festa de aniversário de Kenia, eles me incriminaram pelo roubo de um colar e me forçaram a andar sobre brasas para provar minha inocência.
A gota d'água foi quando Cássio mandou jogar o corpo do meu pai no oceano, apenas para proteger a assassina, Kenia Cline.
Ele achou que tinha me quebrado. Mas meu pai, um advogado cauteloso, me deixou dois presentes: um acordo pós-nupcial blindado que me dava direito à metade do império bilionário de Cássio, e uma cópia secreta e criptografada do vídeo que ele pensou ter apagado. Ele não fazia ideia de que não tinha apenas destruído sua esposa; ele havia criado sua carrasca.
Capítulo 1
O telefone tocou, um som estridente e feio que cortou o silêncio do apartamento. Clara Viana ergueu os olhos da tela, uma mancha de azul-celeste na bochecha. Era do hospital.
"É a Clara Viana?", perguntou uma voz apressada.
"Sim", disse Clara, seu coração começando a disparar.
"Seu pai, Arthur Campos, sofreu um acidente. Ele está no Hospital Sírio-Libanês. Você precisa vir imediatamente."
O mundo girou. Clara largou o telefone e correu para pegar as chaves, sua mente um muro em branco de pânico. Ela ligou para o marido, Cássio Viana, mas a voz dele era um barítono tão frio e indiferente do outro lado da linha.
"Cássio, é o papai. Houve um acidente. Estou a caminho do hospital."
"Te encontro lá", ele disse instantaneamente. "Estou saindo do escritório agora. Não se preocupe, Clara. Vai ficar tudo bem."
Suas palavras me tranquilizaram, mas dirigir pelo trânsito de São Paulo era um inferno particular. Cada semáforo fechado, cada buzina de táxi parecia um golpe pesado. Ela finalmente conseguiu entrar em um trecho mais livre da Marginal Pinheiros, apenas para ver luzes piscando à frente. Uma Ferrari vermelha estava parada de lado, bloqueando completamente as duas pistas da rua.
Uma ambulância estava presa atrás dela, sua sirene soando impotente.
Clara buzinou com força. Uma jovem de cabelo platinado e vestido brilhante se inclinou para fora da janela do carro esportivo. Ela riu, erguendo o celular para filmar o caos.
"Olha pra eles", ela riu para alguém no carro com ela. "Tão desesperados."
Era Kenia Cline. Uma influenciadora, uma socialite e a filha do principal investidor de Cássio. Clara a conhecia. Ela era uma presença constante em suas vidas, uma garota mimada que nunca enfrentou uma única consequência.
"Tira o carro daí!", Clara gritou, inclinando-se para fora da própria janela. "Você está bloqueando uma ambulância!"
Kenia olhou, seus olhos, turvos de álcool, mostrando um lampejo de reconhecimento. Um sorriso malicioso brincou em seus lábios. "Me obrigue", ela articulou com a boca, depois voltou para o celular.
Furiosa, Clara deitou a mão na buzina, soltando um som contínuo e interminável. Outros motoristas se juntaram, um coro de raiva contra a garota arrogante no carro vermelho. Finalmente, depois do que pareceu uma eternidade, um carro da polícia chegou. O policial forçou uma Kenia risonha e cambaleante a mover seu veículo.
A ambulância passou voando. Clara a seguiu, suas mãos tremendo tanto que mal conseguia segurar o volante.
Ela encontrou Cássio na sala de espera da emergência, seu rosto bonito marcado pela preocupação. Ele a envolveu em seus braços.
"Alguma notícia?", ele perguntou.
"Não", ela sussurrou, enterrando o rosto em seu peito. Por um momento, ela se sentiu segura. Cássio era um bilionário da tecnologia, um homem que movia montanhas. Ele podia consertar isso. Ele podia consertar qualquer coisa.
Um médico finalmente saiu, seu rosto sério. "Senhorita Campos?"
O sangue de Clara gelou.
"Fizemos tudo o que podíamos", disse o médico, sua voz gentil. "Seu pai sofreu um evento cardíaco grave. O atraso na chegada dele... foi crítico. Sinto muito. Nós o perdemos."
As palavras não faziam sentido. Nós o perdemos. Uma frase simples que estilhaçou seu mundo inteiro. Seus joelhos cederam, e Cássio a segurou, amparando-a enquanto uma onda de escuridão ameaçava engoli-la. Seu pai, seu único parente, o advogado quieto e firme que a criou sozinho, se foi.
E não foi apenas um acidente. Ele poderia ter sido salvo.
A dor rapidamente se transformou em um nó frio e duro de raiva em seu peito. Ela tinha visto a responsável. Ela tinha visto Kenia Cline, bêbada e rindo, enquanto segurava a vida de seu pai em suas mãos e a jogava fora como lixo.
No dia seguinte, Clara foi à polícia. Ela deu um depoimento, sua voz trêmula, mas clara. Descreveu o carro de Kenia, seu estado de embriaguez, a forma como ela bloqueou deliberadamente a ambulância. Ela tinha o número da placa memorizado.
"Vamos investigar, senhora", disse o delegado.
Clara esperou. Um dia se passou. Depois dois. Ela ligou para a delegacia. O delegado foi evasivo.
Finalmente, uma semana após a morte de seu pai, houve um avanço no caso. Uma prisão foi feita. Mas não era Kenia Cline. Era seu motorista particular, um homem de cinquenta e poucos anos com um rosto cansado e derrotado, que confessou tudo. Ele alegou que tinha pego o carro sem permissão para um passeio.
Era uma mentira. Uma mentira descarada e insultuosa. Clara tinha visto Kenia com seus próprios olhos.
Ela tinha sido meticulosa. Presa no trânsito atrás da ambulância, ela havia gravado um vídeo em seu celular. Estava tremido, filmado através do para-brisa, mas era claro o suficiente. Mostrava o rosto de Kenia, rindo no banco do motorista. Mostrava a hora. Era uma prova irrefutável.
Ela preparou uma pasta para o promotor, imprimindo fotos do vídeo, escrevendo uma linha do tempo detalhada. Era o que seu pai, um advogado, teria feito. Seja metódica. Esteja preparada.
Naquela noite, ela confrontou Cássio em seu escritório em casa, o espaço elegante e minimalista com vista para o Parque Ibirapuera. A pasta de provas estava em sua mão.
"Eles prenderam um bode expiatório", disse Clara, sua voz sem emoção.
Cássio ergueu os olhos do laptop, sua expressão indecifrável. "Eu soube. É uma situação complicada, Clara."
"Não é complicado", ela retrucou. "Kenia Cline matou meu pai, e a família dela está pagando alguém para assumir a culpa. Temos que mostrar meu vídeo ao promotor."
Cássio se levantou e contornou a mesa. Ele era um homem alto, carismático e poderoso, acostumado a comandar todos os ambientes em que entrava. Ele estendeu a mão para ela, mas ela se encolheu.
Seu rosto se contraiu quase imperceptivelmente. "Clara, temos que ser sensatos sobre isso."
"Sensatos? O que é mais sensato do que a verdade?"
Ele suspirou, como um marido paciente lidando com uma esposa emotiva. Era um olhar que ela estava começando a odiar. "O pai da Kenia, Douglas, é meu principal investidor. A família Cline e a família Viana têm um relacionamento de gerações. Nossa nova fusão... vale bilhões. Garante nosso futuro. O seu futuro."
Clara o encarou, uma suspeita horrível surgindo. "O que você quer dizer?"
"Quero dizer que", ele disse, sua voz baixando para um sussurro conspiratório, "Douglas está cuidando disso. Ele se sente péssimo com o que aconteceu. Ele garantiu que o motorista será compensado. A família do homem terá a vida resolvida."
O ar lhe faltou nos pulmões. "Compensado? Meu pai está morto, Cássio. Morto. E você está falando de dinheiro?"
"Foi um acidente trágico e lamentável", ele disse, suas palavras precisas e frias. "Kenia foi imprudente. Ela está sendo punida."
"Punida? Como? Ganhando um carro novo?"
"Isso não está ajudando, Clara. Você está sendo histérica."
A palavra a atingiu como um tapa. Histérica. A clássica forma de desqualificar. Ela sentiu um tremor de pura fúria. "Eu não estou sendo histérica. Estou de luto. E quero justiça para o meu pai."
"A justiça está sendo feita."
"Não! Uma mentira está sendo servida! E você... você está ajudando eles. Você está escolhendo seu negócio em vez da vida do meu pai."
"Isso é injusto", ele disse, seu tom endurecendo. "Estou protegendo nossa família. Nosso legado. O que está feito, está feito. Não podemos trazê-lo de volta, mas podemos garantir nossas vidas."
Clara sentiu uma decepção profunda, esmagadora. Este homem, que ela amara, por quem ela havia colocado sua própria carreira artística em espera, era um estranho. Ele via sua dor como um inconveniente, um problema a ser gerenciado.
"Eu tenho o vídeo, Cássio", ela disse, sua voz baixa e perigosa. "Vou levá-lo ao promotor eu mesma."
Seus olhos ficaram frios. Pela primeira vez, ela viu o narcisista por trás da máscara encantadora, o homem obcecado apenas pelo poder e sua imagem pública.
"Não seja tola, Clara."
"Me dê um motivo para não ser."
Ele não respondeu. Apenas caminhou até o bar e serviu dois copos de uísque. Entregou um a ela. "Beba isso. Vai te ajudar a se acalmar."
Sua mão tremia. Ela olhou para o líquido âmbar, depois de volta para o rosto dele. Não viu amor ali. Nenhuma dor compartilhada. Apenas cálculo.
"Vamos superar isso", ele disse suavemente, sua voz novamente no tom suave e reconfortante que ela conhecia tão bem. Era uma atuação. "Amanhã, falaremos sobre criar uma fundação de caridade em nome do Arthur. Uma grande. Será uma maneira maravilhosa de honrar sua memória."
Clara se sentiu enjoada. Honrar sua memória? Enterrando a verdade de sua morte sob uma pilha de dinheiro?
Ela sentiu uma onda súbita e avassaladora de tontura. O quarto girou. Ela apoiou a mão na mesa para se firmar. Mal havia tomado dois goles do uísque.
"Cássio...", ela arrastou as palavras, sua língua parecendo pesada. "O que tinha...?"
O rosto dele nadou diante dela. Ela o viu pegar o celular dela da mesa, seu polegar movendo-se habilmente pela tela.
"Apenas uma coisinha para te ajudar a dormir", ela o ouviu dizer, sua voz parecendo vir de uma grande distância. "Você tem estado sob muito estresse. Precisa descansar."
A última coisa que ela viu antes que a escuridão a consumisse foi seu celular, agora na mão dele, e a pasta de provas que ela havia preparado com tanto cuidado.
Quando acordou, uma dor de cabeça lancinante martelava atrás de seus olhos. A luz do sol entrava pelas janelas do chão ao teto. Ela estava na cama deles, ainda com as roupas do dia anterior.
Seu celular estava na mesa de cabeceira. Ela o pegou, o coração martelando contra as costelas. Foi para a galeria de fotos. O vídeo de Kenia Cline havia sumido. Verificou a pasta de itens apagados recentemente. Vazia. Verificou seu backup na nuvem. Nada.
Ele havia limpado tudo. Tudo.
Ela procurou freneticamente pela pasta de papel. Também havia sumido.
Ele a havia dopado. Ele havia dopado sua própria esposa para destruir as provas que levariam a assassina de seu pai à justiça. Tudo por um negócio.
O homem com quem ela se casou não apenas escolheu o lucro em detrimento de sua dor. Ele havia conspirado ativa, cruel e metodicamente contra ela. Ele havia participado do acobertamento. Ele era um cúmplice.
O amor que ela sentia por ele se transformou em algo frio e morto. Em seu lugar, algo novo e terrível começou a crescer. Era uma determinação silenciosa e metódica. Ele achava que a tinha quebrado. Ele não fazia ideia do que acabara de criar.
Seu pai, o advogado cauteloso, sempre desconfiou do imenso poder e riqueza de Cássio. Anos atrás, pouco depois do casamento deles, ele a sentou. "Clara, eu amo que você esteja feliz", ele disse, "mas homens como Cássio... eles veem o mundo de forma diferente. Quero que você esteja protegida."
Ele a fez assinar um acordo pós-nupcial. Era blindado, redigido por sua própria mão. Na época, Clara achou mórbido, desnecessário. Ela amava Cássio. Ele a amava.
Agora, era sua chave. Era sua fuga. E seria a semente de sua vingança.
Ela se deitou nos travesseiros, os lençóis de seda parecendo uma jaula. Fechou os olhos e deixou as lágrimas de dor e traição finalmente caírem. Mas não eram lágrimas de derrota. Eram uma promessa. Uma promessa ao seu pai.
Cássio Viana e Kenia Cline pagariam. Ela queimaria seus impérios até as cinzas. Ela os faria pagar pelo que fizeram, não com dinheiro, mas com sua liberdade, suas reputações, seu mundo inteiro. E ela faria tudo com um sorriso no rosto. A guerra tinha apenas começado.