O cheiro a desinfetante ainda me sufocava no hospital. Acabara de perder o nosso bebé. O Pedro estava ali, a descascar uma maçã, calmo e sem emoção. Ele não mencionou o bebé. Perguntei-lhe porque não atendeu o telefone quando eu sangrava em casa. A resposta dele apunhalou-me. "Eu estava ocupado. A Sofia caiu e magoou o joelho. Levei-a ao hospital." Sofia, a sua "boa amiga", precisava dele mais do que a sua esposa a ter um aborto sozinha? Uma raiva fria gelou o meu corpo. Ele admitiu saber da perda do bebé, mas disse que "ainda éramos jovens e podíamos ter outros" . Como se este bebé não importasse. Como se a minha dor não existisse. Poucos minutos depois, a minha sogra entrou no quarto. Em vez de consolo, ela me atacou impiedosamente. "Que inútil. Nem para segurar um bebé serves." O Pedro permaneceu em silêncio. Nem uma palavra em minha defesa. O meu coração estilhaçou-se. A dor era insuportável, mas a minha voz saiu firme. "Pedro, vamos divorciar-nos." Ele riu, chamando-me de irracional e dramática. Como pude amar um homem tão cego e cruel? Como pudemos chegar a isto? Será que esta era a minha única saída? Decidi. Ele pagaria pelo seu abandono e pelas suas mentiras. Eu iria reconstruir a minha vida, custasse o que custasse.