Quando acordei no hospital, um vazio gelado preenchia o lugar onde meu filho deveria estar. Nosso bebê não resistiu ao incêndio. Meu irmão Leo, por pouco, não morreu na UTI. Liguei para meu marido, Marcos, um bombeiro que deveria ter estado lá por nós. Sua voz era impaciente: "Clara? O que foi? Estou ocupado." Ocupado salvando Sofia, nossa vizinha, e o gato dela. Ele a tirou do oitavo andar, alegando uma "decisão tática", enquanto nosso apartamento no décimo ardia. Meu sogro, Ricardo, um bombeiro reformado influente, ligou-me, furioso. "Como ousas ameaçá-lo com o divórcio? Ele é um herói! Deves estar grata por ele ter salvado Sofia!" A cidade inteira parecia concordar: Marcos era o salvador, e eu, a mulher ingrata e histérica. A dor da perda se transformou num peso insuportável de raiva e incredulidade. Foi quando Leo, mal conseguindo respirar na UTI, sussurrou as palavras que me derrubaram. "Eu liguei para ele. Disse que não conseguia respirar. Ele disse... 'Aguenta, Leo. Tenho de tirar a Sofia primeiro.'" Não foi uma "decisão tática". Foi uma escolha. Ele nos abandonou para morrer! Aquela raiva, pura e ardente, incinerou qualquer lágrima que me restava. Naquele dia, não fui para casa. Fui ao melhor escritório de advocacia da cidade. Não quero seu dinheiro. Quero justiça. Vou arrasar sua carreira, sua reputação, seu falso heroísmo. A verdade vem à tona. E eu vou empurrá-la com todas as minhas forças.