O corredor do hospital cheirava a desinfetante e a medo. Meu pai estava a morrer, e eu precisava do meu marido, Leo, para assinar os papéis da cirurgia que o poderia salvar. Liguei-lhe incessantemente, implorando que viesse, mas a sua voz irritada afirmou: "Não posso ir agora. A Clara torceu o tornozelo. Ela precisa de mim. Tu consegues resolver isso, Sofia." Enquanto o monitor cardíaco do meu pai se tornava uma linha reta, Leo apareceu, horas depois, com um café e uma preocupação encenada. Ele justificava-se com a "sensibilidade" da Clara, a "fraternidade" que os unia, e como ela era "frágil". A sua mãe, Inês, juntou-se ao coro, acusando-me de egoísmo. A própria Clara ligou, com a sua voz chorosa, revelando a farsa. Meu pai morreu sozinho, enquanto o meu marido consolava outra mulher por um tornozelo torcido. Como podiam esperar que eu aceitasse este abandono monstruoso? Que homem veria o seu dever para com a esposa e o sogro como igual à "obrigação" para com uma "irmã" que vive de vitimização? A ironia e a raiva foram o catalisador. Olhei para o fundo dos olhos vazios do Leo, naquele dia de luto, e disse: "Quero o divórcio." Sabia que a batalha seria árdua, mas eu estava pronta. Era o momento de me escolher a mim mesma e lutar pela minha liberdade e paz, custasse o que custasse.