O cheiro acre do fumo acordou-me, grávida de nove meses, mergulhando-me num pesadelo. Fogo. Presa no 12º andar com a minha mãe, que mal podia andar, o pânico gelou-me o sangue. Liguei desesperadamente ao meu marido, Tiago, que estava no ginásio ao lado. Mas ele não atendeu. O incêndio levou tudo, inclusive o meu filho por nascer, David. No hospital, a verdade foi um golpe ainda mais cruel: Tiago estava bem, mas optou por salvar a sua meia-irmã, Sofia, e o gato dela. "O Miau era importante agora", disse ele, irritado. A sua família, o sogro Artur e Sofia, apoiavam-no descaradamente, enquanto o corpo do meu filho jazia sem vida. Tiago tinha mentido aos bombeiros, garantindo que não havia mais ninguém nos andares superiores, quase condenando-nos à morte. Como podia o homem a quem entreguei a minha vida ser tão cruel e indiferente à nossa tragédia? Como puderam eles, a sua família, olhar para mim, vazia e dilacerada pela dor, e ter a audácia de me chamar de histérica e ingrata? A sua traição era insuportável. Mas o choque deu lugar a uma clareza cortante. Não havia lágrimas, apenas uma determinação férrea: "Quero o divórcio." Eles pensaram que eu estava quebrada, mas eu estava a levantar-me das cinzas. Mal sabiam eles, uma testemunha inesperada e uma gravação chocante iriam virar o jogo. Isto não era apenas o fim do meu casamento; era o início da minha busca por justiça.