Sophie sempre soubera que tinha uma paixão pela escrita, algo que a acompanhava desde a infância. Nos tempos de escola, ela se destacava pelas redações criativas, pelas histórias que inventava durante as aulas de literatura, e pelos personagens que pareciam ganhar vida através das suas palavras. No entanto, a realidade de sua vida adulta era bem diferente dos sonhos que ela cultivava. Ela se via presa em uma editora pequena, escrevendo sátiras e quadrinhos para um público limitado, sem nunca ser reconhecida pelo talento que tinha para a escrita. A editora não pagava o suficiente para cobrir as contas de seu modesto apartamento e muito menos o empréstimo estudantil que ela ainda carregava nas costas.
Sophie se sentia em uma rotina estagnada, onde seu trabalho nunca parecia ser o suficiente. Sempre que terminava uma história, mandava para editoras maiores, acreditando que algo poderia mudar, mas a resposta nunca era diferente. "Falta alguma coisa", diziam todas, sem exceção. Um simples "não" que carregava em si o peso da frustração. Ela se perguntava o que exatamente faltava, o que ela precisava fazer para que alguém, alguma editora, olhasse seu trabalho com mais seriedade. O "algo mais" que todos pareciam querer, mas que ela nunca conseguia entender. Talvez fosse algo na forma como ela escrevia, ou talvez fosse o simples fato de não ter o "toque" que os editores buscavam em seus romances.
O término com Marcos, seu ex-namorado, piorou ainda mais seu estado de espírito. Eles estavam juntos desde os tempos da faculdade. Ele sempre foi aquele tipo de namorado ideal - atencioso, carinhoso, e com planos para o futuro. Mas, como a vida de Sophie, a relação deles também entrou em um ciclo de monotonia. Marcos, cansado da rotina e dos desencontros, chegou a um ponto em que sentiu que não conseguia mais continuar com a relação. O término foi abrupto, doloroso e sem grandes explicações. Cinco dias atrás, ele apareceu na porta de seu apartamento, com os olhos cansados, o semblante sério e as palavras que Sophie jamais esqueceria: "Eu não posso mais continuar assim, Sophie. Falta alguma coisa, você sabe disso."
Aquelas palavras de novo ecoaram em sua mente, falta alguma coisa. Sophie tentou procurar algum sentido nelas, mas nada fazia sentido. Como alguém que havia sido sua vida inteira por tanto tempo, agora se afastava tão facilmente? O sentimento de inadequação se instalou ainda mais em seu coração, e, no fundo, ela se perguntava se o que ela tinha dado a Marcos havia sido insuficiente. Será que ele sentia que faltava algo nela? Algo que ela não conseguia identificar, mas que ele com certeza via, ela era tão monótona assim? Tão simples?
Sua amiga Laila, já não aguentando mais ouvir sobre Marcos, fazia cinco dias em que ela se encontrava nesse estado de pura tristeza e lástima, apareceu com um convite inesperado.
- Ah, não, amiga, você tem que esquecer esse Marcos! Já não aguento mais ouvir falar de Marcos, Marcos, Marcos! Já chega, né? Não deve ser tão difícil esquecer esse bosta. Ele é meu primo, mas é um bosta, amiga. Me desculpa. - Laila exclamou, com seu tom sempre animado.
Sem resposta de Sophie, Laila continuou, impaciente.
- Fui convidada para uma festa de noivado. É de uma amiga minha da escola, Helena. Faz tempo que ela namora esse tal de Gabriel, ele é o herdeiro da editora Ideias Luminar, você deve conhecer. - disse Laila, animada, esperando arrancar alguma reação.
Sem resposta de Sophie, novamente.
- Vai ser uma festa incrível, você tem que vir! Laila insistiu, com sua energia contagiante. - Helena é amiga de escola, sabe? Aquela que sempre teve tudo o que queria... Ela e o noivo são super ricos. Vai ser uma festa muito chique!
Sophie hesitou. O que ela faria em um evento tão chique? Não tinha roupas adequadas, e, além disso, ela se sentia emocionalmente despedaçada. Para que ir a uma festa luxuosa quando o próprio coração estava quebrado? No entanto, Laila insistiu, e Sophie acabou cedendo. No fundo, ela sabia que precisava sair de sua zona de conforto, mesmo que isso a fizesse se sentir ainda mais deslocada.
- Eu não tenho o que vestir, Laila. Sophie disse, com a voz um pouco cansada.
- Não se preocupe com isso. Eu te empresto um vestido lindo que nunca usei. Vai ser divertido, te prometo. - respondeu Laila, tentando convencê-la.
No fundo, Sophie sabia que sua amiga estava apenas tentando animá-la, tentando tirá-la de sua solidão. Ela aceitou, mesmo sem saber muito bem o que esperar. A noite chegou e Sophie se viu se arrumando com um vestido azul de pano fino que Laila havia lhe emprestado. Um vestido que só pelo pano macio e cheio de detalhes devia ser bem caro. Ele tinha um V nas costas que parava um pouco acima do bumbum e, na frente, o decote realçava seu busto. Ela se olhou no espelho, vendo uma versão dela mesma que mal reconhecia - mais bonita do que jamais se sentira. No entanto, a insegurança ainda estava presente, mas ela se obrigou a seguir em frente.
Ela foi, sem grandes expectativas, apenas tentando se distrair da dor que ainda sentia por dentro. No fundo, sabia que a festa seria um reflexo do mundo que ela jamais poderia fazer parte - o mundo de Laila, de Helena, de Gabriel... e, de alguma forma, o mundo que sempre soubera que não estava ao seu alcance.