Ela se vira para mim sorrindo enquanto termina nosso almoço, vou colocando os talheres ao lado dos pratos, papai já está chegando.
- Vamos para São Paulo filha, já te disse.
Não sei porque perguntei, afinal já sabia a resposta, as lagrimas queimam meus olhos pensando em tudo que vou deixar para trás.
- Não chora minha princesa. - Sua voz doce me embala, enquanto a mão suave limpa as lagrimas que cobrem minhas bochechas.
A porta da cozinha se abre, olho para papai quem corre para me abraçar.
- Não quero ir papai!
Seus braços me apertam em um conforto silencioso, então deixo minhas lagrimas correrem sem medo, choro como se o mundo fosse acabar, porque para mim naquele momento estava acabando mesmo.
- Por favor papai, não quero ir!
Com uma doçura que sempre lhe foi característica ele alisa minhas costas com carinho, beija meus cabelos.
- Eu sei minha princesa, eu sei! - Ele se abaixa um pouco me olhando nos olhos ele diz: - Papai promete a você filha, que você vai conhecer outros amigos, vai estudar em uma boa escola, te prometo princesa que vamos ser muito felizes.
Na minha cabeça aquilo tudo era por minha culpa, eles queriam que eu tivesse uma vida melhor, e isso só era possível em São Paulo?
- Não vou pedir mais nada eu juro! - Prometi juntando as mãos enquanto ainda chorava muito.
Na minha inocência infantil, achei que papai precisava de mais dinheiro porque eu sempre queria mais brinquedos novos e comprar chocolates.
Minha mãe se aproxima, se abaixando até minha altura, com sua suavidade e sorriso contido ela segura meu rosto enquanto me explica.
- Filha, seu pai recebeu uma boa proposta de emprego, precisamos ir querida, não é por sua causa.
E assim fiz minhas malas, guardei minhas bonecas em uma caixa e me despedi dos meus amigo, dando adeus a vida que eu amava em Curitiba.
SÃO PAULO, SETE ANOS DEPOIS.
- Rafa, você já decidiu o que vai fazer?
Magali me pergunta pela milésima vez, olho minha amiga que tem um que de traços árabes provenientes da sua família, com olhos marcados, cabelos escuros e volumosos, linda.
- Continuo querendo medicina, minha mãe super apoia.
Ela me entrega as entradas do cinema, separo o dinheiro para a pipoca, Magali foi a primeira amiga que fiz na escola, desde então somos inseparáveis.
- Já me decidi também vou fazer. Quero me especializar em mulheres gravidas, quero trazer mais vidas a este mundo.
Olho para minha amiga sorrindo ao pensar no futuro da nossa profissão.
- Nossa Ma, isso é tão legal.
- E você, no que pretende se especializar?
Colocando a primeira pipoca na boca, parei para pensar que ainda não sabia o que de fato queria fazer dentro da medicina.
- Ainda não sei, quando estiver lá, vou descobrir.
E assim, terminei o ensino médio e fiz o vestibular para medicina na USP e passei. Foram anos intensos de estudo e dedicação, claro que fiz novas amizades e fui a muitas festas, e por mais que eu tenha juízo e ame estudar, sou uma garota que gosta de se divertir.
Aprendi a viver em São Paulo, a amar essa loucura de cidade, foi aqui que eu cresci, estudei, me formei, me apaixonei.
Trabalho em um excelente hospital, como cirurgiã cardiologista, descobri que cuidar de corações é minha vocação.
LUCAS
QUINZE ANOS ANTES.
Ser um adolescente no corpo de um homem, nem sempre é bom, sou jovem demais para algumas coisas e homem demais para outras. No final da minha adolescência já estou com 1,96 de altura, o que me proporcionou ser capitão do time de vôlei da escola e conhecer muitas meninas, que me achavam no mínimo interessante. Um desses benefícios foi começar a sair para as festas que meu irmão mais velho vai.
Hoje vamos a casa da Bia, uma menina mais velha que estou ficando, os pais dela não estão na cidade e ela decidiu fazer uma festinha. Resolvi tomar coragem e pedi-la em namoro hoje, Luís meu melhor amigo diz que namorar é coisa de mané, que mulher nenhuma vai prendê-lo, acho que ele só não encontrou uma garota como a Bia, ela é meiga e gentil, além de muito gata.
- Nossa você está lindo filho.
Mamãe fala sorridente quando me vê descendo as escadas, o idiota do meu irmão fica rindo.
- Benjamin, já sabe né?
- Sei mãe. - Ben me olha rindo. - Tenho que tomar conta do meu irmãozinho!
- Idiota! - Digo dando um tapa na cabeça dele que fica alguns centímetros abaixo de mim.
É foda, mamãe age como se eu ainda fosse um garotinho, já sou um homem, vou fazer dezoito em cinco meses!
- Nada de bebedeira meninos!
- Pode deixar mãe!
Ben fecha a porta rindo é claro que vamos beber!
(...)
Tinha bastante gente na casa da Bia, o que só me deixa mais ansioso para encontrá-la.
- Tá procurando alguém Lucas? - Luís pergunta me entregando um copo de cerveja.
- Não, só observando as garotas.
Disfarço para não fazer papel de bobo e ficar pagando de apaixonadinho, não mesmo.
Dou um gole na cerveja já caminhando pelo local, ainda não vi Bia, mas a Fernanda uma colega dela se aproxima para conversar, sou meio novo nessa coisa de pegação, mas tenho certeza que ela está me dando mole, mesmo sabendo que estou de rolo com sua amiga.
Já perto da piscina em um canto mais escuro a vejo, a poucos metros beijando Luciano, um colega de turma, senti uma coisa estranha revirar dentro de mim, raiva eu acho. Fiz papel de bobo esse tempo todo, mas isso acaba agora!
Viro para Fernanda que estava parada atras de mim com um sorrisinho no rosto, sem muita conversa a beijo, a garota não me empurra ou algo do tipo, pelo contrario, suspira em minha boca, me puxando pelo pescoço para que eu a sinta mais, é quando sinto uma mão tocar meu ombro.
- O que vocês estão fazendo? - É Bia quem pergunta me encarando, a garota se sente no direito de me questionar!
- Você já deveria saber que não costumo repetir a mesma garota duas vezes, se dê por satisfeita de ter sido privilegiada, se aproveitou bastante desse corpinho aqui.
As duas garotas me olham com certo espanto, mas não serei eu a fazer papel de trouxa a essa altura do campeonato, viro as costas saindo dali decidido a nunca mais me deixar levar por mulher nenhuma, principalmente as que tem doçura no olhar e sorriso meigo. E assim nasceu em mim esse homem frio que abomina relacionamentos e não acredita nos sentimentos. Tudo que sempre quis a partir daquele momento com as mulheres, foram transas intensas e sem compromisso, nada de dormir na minha casa, isso torna as coisas pessoais, para isso existe motel. Apresentar a família nem fodendo, minha mãe pira com a possibilidade de ter uma nora, está para nascer a mulher que me fará sentir desejo em ficar amarrado em uma só!