Suas escolhas fazem seu caminho, ditam suas regras e definem quem você é. Para toda causa um efeito. Para toda redenção uma culpa. Para toda afirmação uma negação. Para toda escolha uma consequência. Para todo ódio... O amor! Independente das escolhas que fizer, para alguns, Owen Hughes, sempre estará errado. A ciência o explica, a religião o rotula, mas ele sabe quem é, e lida muito bem com todas as suas decisões. O que o aguarda no futuro é o que importa, e lá só consegue ver uma pessoa, Ellis Hill. A doçura daquela mulher o fez ansiar por algo que nunca teve, amor, e temer o que nunca temeu, a verdade.
Owen seguia pela rodovia principal em direção a chácara onde passaria o fim de semana. Abriu o vidro do carro querendo sentir o cheiro do verde das plantações ao longo da rodovia. A primeira semana da primavera já podia ser sentida na pele, o Canadá era conhecido por seu clima frio durante quase todo o ano, mas aquele início de estação estava especialmente quente. Depois de passar semanas viajando, voltou ao seu país e essa manhã seguiu direto para a cidade de Vitoria, na parte Sul da Ilha de Vancouver.
Virou em uma estrada de pedras e seguiu mais alguns metros até parar o carro. Desceu observando ao redor. A sua direita uma vegetação exuberante que exalava um odor agradável. A sua esquerda, um muro de pedras semi coberta com ervas daninhas e flores silvestres. Leu mais uma vez o nome do lugar no bloco de notas do celular. Seu amigo o havia convidado para um fim de semana que eles costumavam chamar de 1“sem lei”, regado a bebidas, música, comida e algumas outras coisas que ele preferia nem pensar naquele momento.
North Wood, leu a placa do lugar mentalmente. Definitivamente estava no local certo.
Saiu do carro e tocou a campainha, não demorou muito para ouvir alguém se aproximar.
— Quem é? — perguntou a voz feminina do outro lado.
— Me chamo Owen Hughes, vim a convite de Douglas Hill.
O portão se abriu revelando uma jovem loira de estatura mediana e muito bonita. Fitou-lhe com atenção e em seguida esticou-se para fora olhando de um lado para o outro.
— Veio sozinho? — perguntou ela.
— Sim.
— Esse carro é seu?
— É.
— Vou abrir o outro portão para você guardá-lo aqui dentro.
Owen assentiu e agradeceu mentalmente à praticidade da garota.
Quando já havia estacionado o carro no grande jardim onde alguns outros veículos faziam fila, ele voltou seu olhar à mulher que o havia recebido. Habilmente ela trancou os portões e Owen via o corpo curvilíneo mover-se elegantemente. Se houvessem recepcionistas tão belas como ela nos muitos hotéis por onde teve que passar nos últimos meses, talvez suas viagens fossem menos tediosas.
Ela virou-se indo em direção a ele.
— Douglas saiu para comprar algumas coisas que estavam faltando na dispensa, mas ele não vai demorar. Posso te mostrar o seu quarto ou a casa se quiser.
— No momento só o quarto está bom, obrigado.
Owen pôs a mochila em um dos ombros e a seguiu. A propriedade era grande, havia duas casas uma próxima à outra. A que ficava no cento da propriedade era maior que a que ficava ao lado. As duas em estilo vitoriano e muito elegantes. Ele foi guiado a primeira e seguiu por um corredor não muito longo, a mulher abriu a porta de um dos cômodos.
— É esse! Tem uma cama de casal porque Douglas disse que você viria acompanhado.
Owen sorriu de canto.
— Estou solteiro — disse e estranhou aquela afirmação tão segura a uma estranha. Ele não era de expor sua vida a quem não tinha intimidade. Poderia apenas reafirmar que tinha vindo sozinho ou que ficaria sozinho aquele fim de semana, não informar o seu status de relacionamento.
Alguma coisa em sua expressão pareceu denunciar seus pensamentos, pois a garota sorriu fazendo Owen esquecer sobre o que estavam falando. Leves curvinhas se formaram nas bochechas e um rubor encantador cobriu o rosto dela.
— Estranho! Douglas parecia ter certeza que você viria com alguém.
— Eu viria, mas... Se você tiver alguém precisando desse quarto eu posso trocar por um de solteiro, sem problemas.
— Ah, não! Não se preocupe. Todos já estão bem instalados, você era o único que faltava chegar — disse ela. — Bem, vou deixar você descansar, quando Douglas chegar eu o avisarei que você já está aqui, tenho certeza que ele vai adorar saber. Passou ontem o dia inteiro falando sobre você.
Owen sorriu, Douglas era um grande amigo, as vezes um tanto excêntrico, mas de uma lealdade que nunca vira antes.
— Obrigado, senhorita...
— Ellis! Me chamo Ellis Hill.
Hill também era o sobrenome de Douglas, mas ele não tinha irmã.
— Sou prima do Douglas — informou como se estivesse lendo seus pensamentos.
— Eu estava mesmo me perguntando se vocês eram parentes.
— Eu imaginei.
— Bem, Ellis, prima do Douglas, é um prazer conhecê-la!
Estendeu a mão que ela não hesitou em aceitar. Owen sentiu a pele delicada e macia tocar a sua, se surpreendeu com alguns calos que roçaram sua pele. Como ela os tinha conseguido? Perguntou-se sem tirar os olhos dos dela. Percebeu que não havia aliança, ou seja, nenhum compromisso muito sério, talvez tivesse namorado, mas o olhar de interesse que via nos olhos dela lhe permitia imaginar que não.
— O prazer é meu — respondeu apertando suavemente a mão dele.
Ellis percebeu o olhar diferente que o amigo do primo dirigia a ela e não podia ser indiferente. Owen Hughes não era nem a metade do que Douglas havia descrito; “é um arrogante, monótono e desagradável, vou convidá-lo por pena, além disso, ele é torcedor do Manchester United e homens de verdade torcem pelo Real Madrid.”, disse Douglas que era viciado nos times de futebol europeus. Ellis não sabia se ele era monótono, mas não parecia arrogante, e definitivamente desagradável não era. Os cabelos eram negros e levemente cacheados, lábios carnudos, queixo quadrado, olhos acinzentados. Alto, corpo largo, parecia com os jogadores de futebol americano. Voz grave e o olhar que ficava entre sensual e cínico. Owen era bastante atraente. — Se precisar de algo... — falou só para pôr um fim as avaliações de olhares insistentes.
— Eu avisarei — completou ele soltando a mão dela que saiu deixando-o sozinho.
***
— Nossa, cara! Depois de tantos anos terminar assim... Parece bem difícil — dizia Douglas que conversava a sós com Owen em uma das mesas de pedra do jardim da propriedade onde estavam.
Havia revisto os amigos de longa data e sido apresentado a outros convidados, a falta de intimidade com a maioria presente não o livrou de ser vítima das brincadeiras sem graça que tinham costume de fazer. Agora relatava ao amigo sobre seus últimos anos de casado.
— Meu relacionamento já estava desgastado. Difícil sempre é, principalmente quando o outro não aceita o fim, mas eu sei o que quero, e um relacionamento que faça eu me sentir um completo estranho não está nos meus planos.
— Você sempre me pareceu muito envolvido. Eu poderia dizer que era amor.
— Era, eu amei, mas acabou. É difícil explicar, às pessoas costumam falar sobre um sentimento que não existe, que é eterno, que tudo supera e não é assim. As dificuldades do dia a dia vão nos provando que precisa-se mesmo é de companheirismo e muito respeito para segurar um casamento. O meu, além de tudo, caiu na rotina, tentei mudar, fizemos viagens, tiramos férias, mas algo não existia mais entre nós. Preferi pôr um ponto final a continuar procurando algo que eu não encontraria.
— Você está certo, Owen. Foi melhor pôr um fim, não adianta insistir em algo que não está te fazendo bem.
Douglas preferia manter o discurso de amigo por “fora da situação”, mas sabia quão tóxico tinha sido o relacionamento de Owen. Desde o início, brigas e ameaças eram feitas a quem se aproximasse dele até que finalmente o amigo se afastou de todos. Apaixonado, não via que estava envolvido em uma relação nada saudável.
Risos femininos interromperam a conversa dos amigos. Owen virou-se e viu a garota que o havia recebido mais cedo, a prima de Douglas, Ellis, que junto as outras garotas conversava animadamente.
— São lindas, não é? — perguntou Douglas. — Quer dizer, não sei se você ainda gosta.
Owen deu uma tapa no braço de Douglas.
— Gosto, e muito!
— Ah! Eu espero que sim.
Ele sorriu de canto, fitando-as novamente. Todas as garotas eram muito bonitas, porém só Ellis lhe chamava atenção.
— Falei para você sobre esse fim de semana — continuou Douglas —, teremos muita diversão, mulheres bonitas e a maioria solteiras. Homens feios, mas a maioria solteiros, você escolhe o que achar melhor.
— Pare com isso, Douglas! — pediu empurrando o amigo, se divertindo com ele e chamando a atenção das garotas que não estavam tão distantes deles.
Seu olhar encontrou o de Ellis e sentiu sua garganta secar. Definitivamente linda. Olhos amendoados em um tom de verde claro que ele nunca vira antes, cabelos longos e loiros, lábios pequenos e delicados, uma suavidade no sorriso que era encantador.
Ellis desviou o olhar rapidamente, mas sorriu junto às outras garotas que perceberam o interesse do recém chegado, assim como Douglas.
— É minha... — disse ele atraindo a atenção de Owen. — Prima querida, e muito, mas muito amada. Ela é uma garota delicada, sensível e romântica. Não é para casos passageiros como as outras.
— Adoro mulheres românticas e também não gosto de casos passageiros, você sabe.
Douglas suspirou.
— Não sei se é uma boa escolha, pode se magoar — disse cautelosamente.
— Está falando de mim ou dela?
— Dos dois, Ellis é um pouco conservadora, entende?
Owen suspirou profundamente.
— Você me entendeu, talvez ela me entenda também.
— Owen... Owen... — falou em tom de advertência.
— Me fale sobre ela — pediu ansioso por ouvir mais sobre Ellis.
Douglas suspirou vencido.
— Ellis é solteira para sua sorte, se formou há pouco tempo em história da arte e trabalha em um museu. Nas horas vagas gosta de pintar. É tímida, mas divertida depois que se sente confortável com alguém. Mora aqui mesmo em Vitoria e não é de sair muito. Só aceitou meu convite por que eu disse que não faríamos muita bagunça. — Riu.
— Combina comigo, também não sou muito de festas, só aceitei porque você insistiu.
— Fazia tempo que não te via, depois que concluímos a pós-graduação você sumiu. O pessoal também sempre me perguntava por você.
— Estou feliz em revê-los.
— Não parece, você está muito distante.
— Eu acho que ainda estou na fase de superar tudo.
— Eu entendo, mas hoje você vai se divertir e vai se sentir muito bem.