Eu a vi desfilar com um vestido que ele comprou para mim, ouvindo seu triunfo mental enquanto ela pensava em esfregar seu cheiro por todo o tecido.
Recusando-me a ser um tapa-buraco no meu próprio casamento, deixei minha aliança em sua mesa e fugi para o Rio de Janeiro para construir meu próprio império.
Pensei que tinha escapado.
Até que os papéis do divórcio chegaram pelo correio, assinados por ele.
Eu estava na minha loja, de coração partido, acreditando que ele finalmente havia me descartado para ficar com seu verdadeiro amor.
Mas então o telefone tocou.
"Dante não assinou aqueles papéis, Helena. Ele está na UTI."
Meu sangue gelou.
"Ele levou dois tiros no peito. Ele começou uma guerra para distrair o inimigo de te encontrar."
Ele não a tinha escolhido. Ele estava morrendo por mim.
Rasguei os papéis e reservei um jato particular.
Se a Morte quisesse meu marido, teria que passar por mim primeiro.
Capítulo 1
Eu estava nua na cama do Chefe mais perigoso de São Paulo quando ouvi a mente dele sussurrar o nome da mulher que ele realmente desejava, e não era eu.
A percepção me atingiu com mais força do que o impulso físico de seus quadris contra os meus.
Dante Carvalho, conhecido no submundo como O Silenciador, movia-se sobre mim com a precisão fria de uma máquina.
Seu corpo era uma arma à qual eu estava ligada por lei e sangue, uma muralha de músculos e cicatrizes à qual a família Vitti me vendeu em troca de uma trégua.
Ele agarrou meus pulsos, prendendo-os nos lençóis de seda acima da minha cabeça.
Seus olhos estavam fechados.
Essa era a única misericórdia que ele me concedia.
Se os tivesse aberto, teria visto as lágrimas escorrendo dos cantos dos meus.
Mas ele não olhou.
Ele apenas pegou.
Apertei os olhos, tentando bloquear a sensação de sua pele na minha, mas não consegui bloquear a voz.
A maldição.
A habilidade que me tornara uma pária na casa do meu próprio pai e uma aberração para qualquer um que se aproximasse demais.
Eu podia ouvir os pensamentos dos homens.
Nem todos, e nem sempre com clareza. Mas em momentos de alta adrenalina, ou luxúria, ou violência, suas mentes se abriam como cascas de ovo, derramando seus segredos.
*Sofia.*
O nome ecoou na minha cabeça, projetado da dele.
*Eu deveria ter chegado mais cedo. Ela está sozinha.*
Minha respiração falhou.
Dante confundiu com prazer.
Ele gemeu, um som baixo e gutural que vibrou contra meu peito, e terminou com um ritmo áspero e cortante.
Ele desabou sobre mim por um instante, pesado e sufocante, antes de rolar para o lado.
O ar frio do quarto invadiu o lugar para substituir seu calor.
Parecia um julgamento.
Dante sentou-se, passando a mão pelos cabelos escuros e úmidos de suor. Suas costas eram uma paisagem de violência, cobertas de tatuagens e velhas feridas de faca.
Ele não disse uma palavra.
Ele não perguntou se eu estava bem.
Ele se levantou e foi para o banheiro.
Fiquei ali, encarando o teto, o nome Sofia ainda zumbindo em meus ouvidos como um zumbido crônico.
Sofia.
A viúva de um soldado de baixo escalão que sangrou até a morte seis meses atrás.
Uma mulher sem status, sem poder e sem nada a oferecer a um homem como Dante.
Exceto, aparentemente, a única coisa que eu não podia lhe dar.
Sua culpa.
E seu coração.
A água do chuveiro ligou.
Sentei-me, envolvendo o lençol em meu corpo. Minhas mãos tremiam, mas eu as forcei a se aquietarem.
Eu não era apenas uma esposa.
Eu era uma Vitti.
Nós não dividíamos.
E certamente não perdíamos para ratas.
Dante saiu do banheiro dez minutos depois, com uma toalha pendurada na cintura.
A água escorria de seu peito. Ele parecia um deus da guerra, esculpido e aterrorizante.
Ele começou a se vestir, puxando uma camisa social preta que custava mais que o carro de muita gente.
"Tenho negócios", disse ele.
Sua voz era grave, áspera pelo desuso. Ele mal falava comigo, a menos que fosse uma ordem.
"À meia-noite?", perguntei.
Minha voz estava firme, não traindo nada do caos dentro de mim.
Ele parou, abotoando os punhos.
"Na estação de trem", disse ele. "Uma carga."
Ele estava mentindo.
Eu não precisava ler sua mente para saber disso. Eu podia ver na maneira como ele não encontrava meus olhos.
Mas ouvi o pensamento mesmo assim.
*Ela está esperando na plataforma. Tremendo. Não posso deixá-la no frio.*
"Eu vou com você", eu disse.
Dante parou.
Ele se virou lentamente, seus olhos cinzentos finalmente se fixando nos meus.
Eles estavam frios, desprovidos de qualquer calor que ele pudesse ter sentido dez minutos atrás.
"Não", disse ele.
"Eu sou sua esposa, Dante", eu disse, levantando-me e deixando o lençol cair aos meus pés. "Se você tem negócios na estação, eu deveria estar lá. A menos que não seja um negócio de família."
Sua mandíbula se contraiu.
*Ela sabe de alguma coisa. Como ela sempre sabe?*
"Vista-se", ele rosnou. "Mas você fica no carro."
O trajeto até a Estação da Luz foi um estudo em silêncio.
A chuva açoitava as janelas do SUV blindado.
Dante dirigia com uma mão no volante, a outra descansando perto da arma embainhada sob o paletó.
Sua mente era uma tempestade de irritação e dever.
Ele me via como um fardo.
Um objeto brilhante que ele tinha que proteger, mas não queria polir.
Quando paramos no meio-fio, não esperei por sua permissão.
Abri a porta e saí na chuva.
"Helena!", ele latiu.
Eu o ignorei.
Caminhei em direção à entrada, meus saltos estalando sinistramente no pavimento molhado.
Dante estava ao meu lado em um segundo, sua mão agarrando meu cotovelo.
"Eu te disse para ficar no carro."
"E eu te disse que sou sua esposa", sibilei.
Entramos na estação.
Era tarde, e o grande salão estava quase vazio.
Exceto por ela.
Sofia estava perto do balcão de informações, agarrando uma mala pequena e surrada.
Ela parecia frágil.
Ela usava um casaco fino demais para o tempo, tremendo levemente. Seu cabelo escuro estava grudado no rosto.
Ela parecia uma tragédia esperando para ser salva.
O aperto de Dante em meu braço afrouxou.
Senti a mudança nele.
O instinto protetor.
A dívida.
Sofia nos viu.
Seus olhos se arregalaram, enchendo-se de lágrimas. Ela olhou para Dante como se ele fosse seu salvador.
Então seu olhar se voltou para mim.
Por uma fração de segundo, a máscara caiu.
Eu ouvi, alto e claro, um grito no silêncio da minha mente.
*Vou tirar essa princesinha do trono. Vou tomar tudo o que é dela, pedaço por pedaço.*
Ela sorriu, um sorriso fraco e trêmulo.
"Dante", ela sussurrou. "Eu não sabia para quem mais ligar."
Dante deu um passo à frente, efetivamente se colocando entre nós.
Protegendo-a de mim.
"Você está segura agora, Sofia", disse ele.
Sua voz era gentil.
Um tom que ele nunca, nem uma vez, usou comigo.
Fiquei ali, a chuva escorrendo do meu cabelo, observando meu marido confortar a mulher que planejava me destruir.
E então percebi que a guerra não tinha apenas começado.
Eu já estava perdendo.