Quando abri os olhos, um cheiro a desinfetante invadiu-me, e a dor no meu útero vazio gritava a perda do meu filho de nove meses. Um acidente de carro brutal tinha levado tudo. Liguei para o meu marido, Miguel, com a mão a tremer. Precisava que ele soubesse. Mas do outro lado, em vez de preocupação, ouvi música alta e risos. Era a festa de noivado da irmã dele. Ele mal me deixou dizer que perdi o bebé antes de, irritado, desligar. Nem um "como estás", nem um "estou a caminho". Apenas: "Não posso falar, a Sofia está a celebrar. Já chamei um táxi." Fiquei ali, incrédula. O meu mundo desabava, e o dele continuava em festa. A minha mãe, furiosa, tirou-me o telemóvel da mão. Dias depois, no hospital, a minha sogra, Lúcia, invadiu o quarto. Ela acusou-me de "drama" e de tentar destruir a família deles. "Perder o meu filho é drama?", pensei. Ela disse que o Miguel estava a "proteger a reputação da família" por causa do noivado da Sofia. Eles valorizavam a imagem mais do que a vida do próprio neto. Senti a traição mais profunda. Não só perdi o meu filho, mas também a ilusão de quem era o meu marido. O vazio era imenso, a raiva fervia. "Mãe," disse eu, com uma voz que não reconheci, "Eu quero o divórcio." Eu ia lutar pela minha dignidade.
