A geladeira estava sempre mais vazia do que cheia, e o som constante do rádio velho, comprado em um brechó há anos, era o único consolo em um mundo que raramente mostrava alguma misericórdia.
Ethan passava seus dias consertando eletrodomésticos velhos e quebrados. O telefone celular que tocava frequentemente era o aviso de que mais um cliente, geralmente desesperado, precisava de ajuda. Às vezes, ele nem precisava sair de casa; o trabalho vinha até ele. Quando alguém tinha algo quebrado - um micro-ondas, uma televisão, um ventilador - Ethan estava lá. Seu maior luxo era esse trabalho sujo. Reparar o que outros não queriam mais. Mas isso não significava que ele fosse feliz. Para ele, era apenas uma maneira de sobreviver. Como uma engrenagem no sistema que nunca o reconheceu.
O rádio, um velho modelo portátil que ainda pegava algumas estações em dias bons, estava sempre ligado ao fundo. A música parecia ser sua única companhia constante. Nada extraordinário tocava, mas a velha voz que anunciava as notícias parecia aliviar a solidão. No verão, ele se sentava na frente do trailer com uma cerveja barata nas mãos, observando o movimento da rua e escutando o som dos carros passarem, sem saber de nada além da rotina que havia criado para si mesmo. Aos domingos, o lugar ficava mais quieto. A maioria das pessoas ia para as igrejas, mas Ethan nunca teve fé. Em Deus? Talvez. Em algo mais? Não. Ele acreditava que as coisas eram do jeito que eram porque o destino, ou a falta dele, tinha sido cruel.
Durante as semanas mais quentes, quando a poeira do asfalto se levantava e a cidade parecia mais abafada do que nunca, Ethan se encontrava em um ciclo que ele já conhecia de cor: acordava às sete da manhã com o som do despertador estridente, tomava um café instantâneo e vestia a velha camiseta da sua faculdade (mesmo que nunca tivesse terminado o curso) e as calças jeans que já estavam mais gastas do que o próprio trailer. Seu café nunca passava de duas xícaras e ele não se importava muito se tinha ou não algo para comer. Às vezes, o trabalho que ele fazia o sustentava, mas a verdade era que a comida era escassa e o dinheiro raramente sobrava.
Ele não fazia questão de se misturar com os vizinhos. A rua não era exatamente uma comunidade de pessoas felizes ou acolhedoras. As relações ali eram rápidas e superficiais, baseadas em quem tinha o quê ou quem estava fazendo o quê. Ethan tinha seus poucos amigos, mas a maioria dos moradores o via como mais um entre os muitos que passavam pelas ruas. Nada de especial. Nada que o tornasse notável.
No entanto, havia algo sobre ele que se destacava: sua habilidade de consertar coisas. Ele não era o mais educado ou o mais bonito, mas entendia de máquinas de um jeito que poucos conseguiam. As peças que ele usava, muitas vezes retiradas de aparelhos antigos ou quebrados, faziam milagres, e isso chamava a atenção de pessoas que não podiam pagar o preço de um técnico profissional. Para muitos, Ethan era apenas o cara que sabia o que fazer quando a TV parava de funcionar ou o ar-condicionado começava a fazer um barulho estranho. Mas para ele, aquilo era o suficiente. Não mais, não menos. Era sua vida, e ele a aceitava. Era a única coisa que ele sabia fazer bem.
Naquele dia em particular, o sol brilhava forte e a rua estava vazia, com exceção do barulho distante de uma moto passando e o canto de um pardal na árvore do lado. Ethan estava sentado no degrau da frente de sua casa, um copo de cerveja nas mãos. Ele não estava preocupado com o que acontecia no mundo. Não importava. Ele estava mais interessado em consertar o ventilador quebrado que estava em sua oficina improvisada no trailer. Com o calor do verão, ele não tinha outra escolha senão tentar fazer o ventilador funcionar. Caso contrário, ele ficaria sufocado.
O cheiro da gasolina que ele usava para limpar as peças se misturava com o calor insuportável da manhã. De repente, o som de um carro parando na frente de seu trailer o tirou de seus pensamentos. Era um som diferente do habitual, mais pesado, mais formal. Ethan ergueu os olhos e viu um carro preto, imponente, estacionado na entrada. A primeira reação foi de desconfiança. Ele já estava acostumado com a rotina e os rostos conhecidos da vizinhança. Mas aquele carro não se encaixava.
De dentro do carro, um homem de terno impecável saiu e se aproximou de Ethan. O olhar do homem era sério, e sua postura fazia Ethan se sentir um pouco deslocado. Ele não sabia o que aquele homem queria, mas havia algo no ar que o fazia sentir que sua vida estava prestes a mudar para sempre.
"Ethan Lancaster?" O homem perguntou, com uma voz profunda e calma.
Ethan, sem entender o que estava acontecendo, se levantou vagarosamente. "Sou eu. O que você quer?"
O homem ajustou os óculos escuros e disse algo que fez o coração de Ethan bater mais rápido: "Eu sou advogado de Richard Lancaster. E você acabou de herdar uma fortuna bilionária."