'Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima', é o que se escuta de um dos moradores do Cantagalo. E falando em morador, nossa história começa com a jovem promissora Maria Rosa, ou apenas Rosa como gosta de ser chamada e é tratada pela maioria. Pense numa mulher bonita, morena dos olhos verdes e cabelos longos e negros, dona de um bronze e curvas invejadas por algumas de suas vizinhas que adoram fofocar sobre a vida da coitada que não faz nada além de trabalhar, estudar e ajudar sua mãe de criação, que na verdade é tia de sua mãe verdadeira.
Rosa ia ser abandonada pela sua mãe biológica que engravidou aos 16 anos, e acreditou que o "amor da sua vida" não havia permanecido ao lado dela por culpa da menina. Ela só tinha 15 dias de vida quando foi largada sozinha e chorando no barraco, e sua mãe decidiu sair pelo mundo em busca de reconquistar o cara que a abandonou grávida, e desde esse dia, ninguém mais teve notícias sobre ela. Do lado da bebê havia um bilhete mal escrito dizendo "por favor, quem encontrar que entregue essa criança a Cleusa, minha tia que mora no alto do morro. Ela saberá o que fazer diferente de mim. Adeus, Ana Paula". E foi exatamente o que aconteceu. Na época, Cleusa e seu então marido decidiram que iriam ficar com a pequena e cuidar dela como filha deles. Cleusa nunca pôde ter filhos, tentou a adoção mas sofria preconceito por morar no morro e Rosa apareceu no seu caminho como uma dádiva dos céus para encantar seus dias.
"_ O que você acha de ficar com ela Sebastião? Podemos cria-la como nossa filha.
_ Se Deus a mandou até aqui é porque tem seus propósitos. Essa semana iremos no cartório registra-la. Maria Rosa será nossa filha a partir de hoje!"
Desde pequena nossa protagonista já encantava com seu jeito doce, meigo e alegre, e então a sua mãe sempre cantava uma música para ela, que é do grande compositor João Gilberto:
"Rosa, Morena
Onde vais, Morena Rosa
Com essa rosa no cabelo
E esse andar de moça prosa?
Morena, Morena Rosa"
Seu pai, seu Sebastião a levava desde criança as rodas de pagode e principalmente na quadra da escola de samba do coração, a Portela. Ele era um homem simpático, amado pelos vizinhos e amigos do morro, adorava uma festa e principalmente o carnaval e por isso, fazia questão que sua esposa e filha estivessem ao seu lado sempre.
Faltavam alguns dias para o carnaval de 2007 quando seu Sebastião sentiu uma forte pressão em seu peito, era um infarto. Tentaram socorrer mas infelizmente ele acabou não resistindo e faleceu horas depois. Toda a alegria que ele esbanjava pelos corredores do morro foi tomado por uma forte comoção, todos sentiram a dor e a perda daquele homem que amava sua família. Aquele lugar aonde morou por anos, que ajudava a todos e sempre batalhou por uma vida digna e para manter sua família bem, agora se via triste pela sua partida.
Seu Sebastião se foi, deixando Cleusa e Rosa sem sua presença física mas jamais sem o sentimento de ter sido o melhor pai do mundo e seu legado por toda comunidade. Ele não era rico de dinheiro, mas era próspero de amor, fé, solidariedade e empatia.
Cleusa fazia de tudo para manter a memória de seu amado vivo no coração de sua filha e assim funcionou. Os anos se passaram e Rosa continuava indo para a quadra da Portela como forma de fazer um tributo ao saudoso Sebastião. Ainda não havia desfilado pela escola mas havia esse sonho em seu coração e queria realizar para homenagear seu guerreiro e em algum momento iria conquistar isso por ele.
Mas agora voltando ao princípio de tudo, apesar da folia, Rosa era estudiosa e dedicada. Trabalhava uma parte do dia numa grande empresa como faxineira, a noite ia pra faculdade fazer um curso de administração e ainda no fim de semana, arrumava tempo para estudar inglês e fazer aulas de balé em um centro de dança na comunidade. Tinha fôlego de sobra e literalmente sambava todos os dias em cima do preconceito, e dos julgamentos do pessoal que não viviam na mesma realidade que ela.
Sempre acordava bem cedo, mas dona Cleusa sempre despertava antes para ajudar a moça a não perder a hora
_ Acorda filha, já são 5 da manhã
_ Hum, hoje é sábado?
_ Não Rosa, é segunda e você tem que trabalhar. Vou preparar seu café enquanto você se arruma. O seu Zinho vai te acompanhar até o ponto de ônibus para você não ficar lá sozinha
_ Tadinho mãe, vai acordar cedo um senhor só pra isso? Era só chamar o Maumau
Ah sim, Maurício, o carinha que era apaixonado por Rosa. É dono de uma academia próximo do morro e irmão do chefe do tráfico que morava ainda mais acima no Cantagalo. Rosa a tratava como amigo, e gostava muito dele porque sabia que ele era de paz e a protegia, mas para ele só ser um amigo não era suficiente e queria algo a mais e dona Cleusa bem astuta, já sabia das reais vontades e o queria manter longe de sua filha
_ Aquele insolente do Maurício? Nem pensar, sei bem que ele tem segundas intenções contigo e quero evitar aborrecimentos para nós
_ Mas mãe, o Maurício é praticamente um irmão pra mim, e é bem mais forte que o Zinho coitado. Além do mais em todo caso, eu sei me virar sozinha
_ Não vamos discutir sobre esse assunto agora Rosa, não confio nele, ainda mais sendo irmão daquele maluco lá de cima
_ Tá, tudo bem eu vou com o coitado do Zinho até o ponto de ônibus. Vou tomar um banho, um café e partir pra matar mais um leão essa semana
- Não demora hein menina!
- Menina, mãe? Já tenho 21 anos sabia?
- Rosa...
- Tá bom mãe, já vou. Oh mãezinha, posso te pedir uma coisinha?
- E o que seria?
- Seria aquele misto quente que só você sabe fazer. Por favorzinho?
- Claro filha, mas vai logo se arrumar senão você atrasa
- Te amo minha rainha master!
A história está só começando.