Meu mundo desmoronou quando descobri que a família dele, seus amigos e até meu próprio pai sabiam de sua vida secreta. Todos assistiram enquanto ele desfilava com sua amante, Thaís, e o filho deles, Jamal, na minha frente. Ele até admitiu que eu era apenas um "meio para um fim" para o legado de sua família.
Quando Jamal desapareceu, Thaís me acusou de sequestrá-lo. Heitor acreditou nela. Ele me trancou em nosso porão por três dias, um castigo por um crime que não cometi. "Ele não é um bastardo!", Heitor rugiu quando questionei se o menino era mesmo dele. "Ele é meu filho! Meu sangue!"
Mas seus olhos desviaram, cheios de incerteza.
Enquanto eu saía cambaleando do porão, machucada e quebrada, minha melhor amiga chegou. "Os papéis do divórcio estão protocolados, Emi", ela sussurrou ferozmente. "Está feito." Olhei para trás, para Heitor, parado atônito na varanda. Seu império de mentiras estava desmoronando, e eu estava finalmente livre.
Capítulo 1
Ponto de Vista de Emerson:
O mundo ao meu redor silenciou no momento em que o vi. Não o Heitor que eu conhecia, aquele que me beijou de despedida há poucos dias, seu uniforme impecável, seus olhos cheios de promessas. Este Heitor era diferente. Ele estava rindo, uma risada profunda e solta que eu não ouvia há anos, enquanto erguia um menino pequeno em seus ombros.
O menino, não mais que seis anos, gargalhava, suas mãos emaranhadas no cabelo perfeitamente arrumado de Heitor. Ele era a cara de Heitor. O mesmo cabelo escuro e rebelde, o mesmo brilho travesso nos olhos. Meu estômago se revirou.
"Papai, mais rápido!", o menino gritou, pulando nos ombros de Heitor.
Papai.
A palavra me rasgou por dentro, um golpe surdo e pesado no peito. Ecoou no restaurante elegante, embora eu soubesse que ninguém mais a ouviu além de mim. Meu marido, Capitão Heitor Patrick, condecorado oficial do BOPE, segurando o filho de outra mulher, uma criança que o chamava de "papai".
Minha visão ficou turva. Eu os observei, uma cena perfeita e aconchegante. Heitor, charmoso sem esforço, inclinou-se para beijar a testa do menino. Uma mulher, esbelta e bonita, sentava-se à frente deles, a mão dela repousando casualmente no braço de Heitor. Era um gesto familiar, um que eu costumava fazer.
Ela sorriu para ele, um sorriso possessivo e íntimo. Os olhos dele encontraram os dela, e naquele olhar fugaz, vi uma ternura que havia desaparecido lentamente de nossas próprias interações. Meu fôlego ficou preso na garganta.
O menino se mexeu, olhando diretamente para mim. Seus olhos, os olhos de Heitor, estavam arregalados e curiosos. Ele inclinou a cabeça, uma imagem espelhada do homem que deveria ser meu marido, minha vida.
Por seis anos. Ele guardou esse segredo por seis anos. Cada "exercício de treinamento" anual era uma mentira. Cada ligação emocionada, cada declaração de amor, uma atuação. Senti uma onda fria de náusea me invadir.
Seis anos atrás, eu estava em uma cama de hospital, os lençóis brancos e estéreis um contraste gritante com a poeira e o sangue do Complexo do Alemão. Eu levei um tiro por Heitor, o protegi com meu próprio corpo durante uma extração mal-sucedida. Os médicos me salvaram, mas não puderam salvar minha capacidade de ter um filho. Meu útero, antes um símbolo de esperança futura, era um deserto estéril.
"Minha Emerson", ele sussurrou, a voz embargada de lágrimas, ajoelhado ao lado da minha cama. "Minha corajosa, minha linda Emerson. Você é tudo que eu preciso. Sempre." Ele jurou que não se importava com herdeiros, com legado. Ele só se importava comigo.
Aquelas palavras, tão doces na época, agora tinham gosto de cinzas. Eram uma piada amarga e cruel.
Meu coração parecia estar sendo espremido por uma mão invisível. Minha cabeça latejava. Senti-me tonta, o restaurante chique girando ao meu redor. Eu precisava de ar. Precisava escapar.
Saí cambaleando do restaurante, o ar frio da noite fazendo pouco para clarear minha cabeça. Minhas pernas pareciam gelatina, cada passo um esforço monumental. Eu só precisava fugir, para qualquer lugar.
Então eu esbarrei direto nela.
"Emerson! Meu Deus, olha por onde anda!", a voz de Beatriz, aguda e familiar, cortou a névoa.
Minha melhor amiga desde a infância, Beatriz Holloway, estava diante de mim, seu cabelo ruivo flamejante um farol sob as luzes fracas da rua. Seus olhos, geralmente cheios de calor, se estreitaram com preocupação ao notar minha aparência.
"Emi, o que há de errado? Você parece que viu um fantasma." Ela estendeu a mão, tocando meu braço gentilmente. Seu toque era uma tábua de salvação.
Minha garganta estava apertada demais para falar. Lágrimas, quentes e incontroláveis, escorriam pelo meu rosto. Balancei a cabeça, incapaz de formar palavras.
"Fala comigo, Emi. O que aconteceu?", sua voz estava mais suave agora, tingida de preocupação genuína.
Engoli um soluço. "Heitor... ele tem um filho, Bia. Um menino. Ele tem seis anos." As palavras me rasgaram, ásperas e cruas.
Naquele momento, meu celular vibrou. Era Heitor. Uma foto dele, sorrindo, contra um fundo militar genérico, com uma mensagem de texto: "Pensando na minha linda esposa. Saudades, amor. Quase terminando aqui. Chego em casa logo."
Olhei para a tela, a imagem zombando de mim. O celular escorregou dos meus dedos dormentes, caindo com um baque no asfalto. Uma nova onda de lágrimas, alimentada por uma raiva ardente, me dominou.
"Ele tem mentido para mim, Bia. Todo esse tempo. Cada 'exercício de treinamento'. Cada mensagem de 'saudades'." As palavras eram um sussurro, carregadas de veneno.
Lá fora, as primeiras gotas de chuva começaram a cair, lentas e pesadas, assim como as lágrimas que embaçavam minha visão. O céu se abriu, liberando um aguaceiro torrencial, espelhando a tempestade que se formava dentro de mim. O mundo estava chorando comigo.
Os Patrick. A família tradicional do Heitor. Eles sempre quiseram um herdeiro, a continuação de seu nome prestigioso. Eu tinha ouvido os sussurros, as perguntas veladas sobre filhos. Mas Heitor sempre as descartava, me protegendo de suas expectativas. Ou assim eu pensava. Seria essa a maneira dele de apaziguá-los?
Lembrei-me da nossa infância, correndo pelos campos atrás da fazenda de sua família, a mão dele sempre encontrando a minha. Ele era meu protetor, meu confidente. Ele jurou que nunca deixaria ninguém me machucar.
Quando a família dele praticamente o deserdou por me escolher, filha de um general, mas não de família tradicional, ele lutou por nós. Ele enfrentou sua mãe formidável, ameaçou renunciar à sua comissão, cortar os laços completamente. Ele me escolheu. Todos viram. Nosso casamento foi um testemunho de seu amor feroz, uma vitória contra todas as probabilidades.
Tudo uma mentira. Uma mentira cruel e elaborada. Meu coração não estava apenas partido; estava aniquilado.
Meu celular tocou novamente. O nome de Heitor brilhou na tela. Olhei para ele, uma mistura de pavor e fúria fria se agitando dentro de mim.
Atendi, forçando minha voz a ficar firme. "Alô?"
"Emerson? Amor, o que foi? Você parece... distante. Está tudo bem?", sua voz, geralmente tão reconfortante, agora me irritava. Estava carregada de uma preocupação fingida.
"Só... um pouco indisposta", menti, as palavras com gosto de cinzas. "Peguei um resfriado, talvez."
"Um resfriado? Droga, eu te disse para se agasalhar. Você está sozinha? Posso estar aí em algumas horas, só preciso terminar as coisas aqui." A preocupação em sua voz era tão convincente, tão ensaiada. Fez meu estômago se contrair.
"Não, não, não se incomode", eu disse rapidamente, talvez rápido demais. "A Bia está aqui. Ela está cuidando de mim."
Houve um momento de silêncio do outro lado. Então, uma risada suave. "Bom. Diga à Bia que agradeço. Te ligo mais tarde, amor. Descanse um pouco."
"Você também", consegui dizer, minha voz mal um sussurro.
Quando eu estava prestes a desligar, ouvi uma voz fina e aguda ao fundo. "Quem era, papai?"
E então, a resposta sussurrada de Heitor, tão terna que me tirou o ar dos pulmões: "Só... uma colega, meu bem. Volte a dormir."
A linha ficou muda.
Minha mão começou a tremer incontrolavelmente, o celular de repente pesado demais para segurar. Senti um pavor gelado se infiltrar em meus ossos, mais frio que a chuva. Colegas? Meu bem? As palavras se repetiam em minha mente, cada uma um golpe de martelo. Minha colega? Meu bem?
Recusei-me a pensar nisso. Eu não podia. Esmaguei o celular contra a parede, a carcaça de plástico se estilhaçando em pedaços.
Então eu gritei, um som cru e primitivo arrancado da parte mais profunda da minha alma. Caí no asfalto molhado, meu corpo sacudido por soluços. Não era apenas um segredo; era uma vida escolhida. Ele não fora forçado; ele havia compartimentado, desfrutado de ambas.
Beatriz estava ao meu lado em um instante, me puxando para um abraço forte. "Oh, Emi. Minha pobre, pobre Emi." Sua voz estava carregada de uma raiva que espelhava a minha. "Ele é um monstro. Você merece muito mais."
Através das minhas lágrimas, um único pensamento se solidificou em minha mente. Isso não era apenas um coração partido. Isso era guerra. E eu ia vencer.