O cheiro a queimado enchia os meus pulmões no décimo segundo andar do prédio em chamas. Grávida de oito meses, agarrei no telemóvel e liguei para a minha única esperança: o meu marido, Marcos, um bombeiro. Atendeu ao terceiro toque, mas logo a voz histérica da Clara, a sua "amiga" de infância, dominou a ligação. O gato dela estava preso numa árvore, e Marcos anunciou que faria um "desvio rápido" para salvá-lo, ignorando o meu pânico. Ele desligou. No hospital, acordei com a barriga vazia: o nosso Leo foi perdido por causa da sua escolha. Marcos chamou-me "dramática" e "histérica pelos meus hormónios", sem qualquer remorso. O seu pai, chefe dos bombeiros, defendeu-o como um herói. Até a Clara enviou uma mensagem patética, pedindo que eu o "perdoasse" pelo seu "grande coração". Um gato. Ele trocou o nosso filho por um gato. A dor era avassaladora, mas a raiva, gelada. Sempre fui a segunda opção na vida dele, mas o abandono desta vez custou a vida do meu bebé. Como puderam ser tão cegos e cruéis, ignorando a tragédia que ele causou? Havia uma teia de mentiras e cumplicidade a desvendar. Com uma calma assustadora perante tamanha traição, olhei para o abismo da minha perda e pronunciei: "Eu quero o divórcio." Mas esta não seria apenas uma separação; seria o início de uma implacável batalha pela verdade e por justiça para o meu Leo.