Ela respirava fundo, sentindo o ar fresco da manhã, mas seu peito parecia pesar com o mesmo dilema que a acompanhava há meses. Sabia que estava vivendo seus últimos dias ali. A carta de aceitação da faculdade na França, que agora repousava sob o travesseiro, era sua passagem para um futuro que parecia tão distante e, ao mesmo tempo, tão real.
No entanto, o preço de sua liberdade seria alto. Seu pai, Richard Harrison, não escondia o desprezo pela ideia de que sua única filha pudesse abandonar as tradições da família. Ele fazia questão de lembrá-la disso a cada oportunidade.
- Cecília!
Sua voz grave ecoou da varanda da casa principal.
- Largue isso e venha para dentro agora.
Ela se levantou, limpando as mãos no avental, e caminhou em direção à casa com o coração acelerado. Cada conversa com seu pai parecia uma batalha.
- Sente-se.
Ordenou Richard, sem sequer olhá-la diretamente. Ele estava sentado à mesa, segurando uma xícara de café com a mão firme, enquanto sua mãe permanecia em pé, em silêncio, perto da pia.
- Recebi uma ligação de Peter hoje cedo. Ele quer saber quando vocês vão oficializar o noivado.
Cecília sentiu o estômago revirar, mas manteve a expressão neutra.
- Pai, eu já disse que não quero me casar com Peter. E, mesmo se quisesse, agora não é o momento. Tenho a bolsa para a faculdade, e eu vou para a França.
Richard riu, um som amargo e quase cruel.
- Você acha que pode me desafiar, garota? Eu decido o que é melhor para você. E essa história de faculdade não passa de um capricho. Você tem responsabilidades aqui.
Ela engoliu em seco, mas seu olhar não vacilou.
- Não é um capricho. É meu sonho, e eu vou realizá-lo.
A mãe de Cecília, que até então não havia dito nada, suspirou pesadamente. Seus olhos denunciavam o medo que sentia de contrariar o marido, mas havia algo diferente naquele momento.
- Richard... talvez devêssemos deixar Cecília seguir o caminho dela.
- Cale-se! - ele a interrompeu, batendo com força na mesa. - Não há discussão.
Cecília fechou os punhos, sentindo a raiva crescer dentro de si, mas não cederia à provocação. Não dessa vez. Com a cabeça erguida, deu um passo para trás.
- Eu vou, pai. Não importa o que você diga.
E saiu da cozinha sem esperar resposta, subindo as escadas rapidamente. Trancou-se no quarto e sentiu as lágrimas escorrerem. Ela sabia que não seria fácil, mas também sabia que não havia outra opção.
Naquela noite, enquanto arrumava suas malas às escondidas, Cecília sentiu o peso da decisão que estava prestes a tomar. Fugiria antes do amanhecer, antes que seu pai tivesse tempo de impedi-la. A liberdade que tanto almejava estava a um oceano de distância, mas, pela primeira vez, ela acreditava que poderia alcançá-la.
O dia seguinte marcaria o início de uma nova vida. E, embora carregasse o medo do desconhecido, Cecília também carregava algo ainda mais forte: a determinação de construir seu próprio destino.