GABRIELA

Ana Gabriela era uma jovem batalhadora que lutou durante a vida toda para se tornar a mulher que ela é hoje, uma grande veterinária que trabalha por amor ao que faz, ve sua vida mudar ao conhecer o seu maior pesadelo, ela só não sabia que ele se tornaria o seu ponto de estresse e paz ao mesmo tempo.

Ana Gabriela.

Acordei de mais uma noite repleta de sonhos incoerentes, ultimamente eu não tenho conseguido dormir nem por 3 horas seguidas sem ter um pesadelo 2 minutos depois.

Depois de tudo que aconteceu com o meu avô, acho que preciso de uma sessão de descarrego pra conseguir voltar a seguir minha vida, se não nunca vou conseguir superar isso.

Quando eu tinha 19 anos eu tive que vir pro Rio pra cuidar do meu avô, antes eu morava em Delmiro Gouveia - AL.

Ele estava com auzheimer e cancer de pele, duas doenças críticas que impossibilitavam ele de fazer qualquer coisa sozinho.

Mesmo nos temos convivido por pouco tempo, eu considerava ele demais e não seria nenhum sacrifício pra mim fazer isso, e além do mais, aqui eu teria a possibilidade de fazer uma faculdade, dar orgulho pra minha família era o que eu mais queria na vida.

Eu era nova, mas pra minha idade eu posso dizer que ja tinha vivenciado certas coisas que “me fizeram forte”, quando eu me formei no ensino médio fui a primeira aluna a conseguir entrar na faculdade, o brilho nos olhos da minha mãe foi a coisa que mais me incentivou até hoje.

É por ela e pelos meus irmãos que eu to aqui hoje.

Com tudo isso eu passei boa parte da minha vida estudando e cuidando do meu avô, a minha rotina era essa, eu não saia e nem tinha amigos. Era eu e eu, sempre vai ser assim!

Depois de sei la, dois anos morando aqui, um belo dia quando eu cheguei da faculdade, tomei meu banho e fui pro meu quarto me trocar eu escutei um barulho da porta sendo aberta, e com isso eu fiquei horrorizada vendo que era o meu avô ali…tirando a roupa e prestes a abusar de mim.

Eu não podia demonstrar fraqueza! Me cobri rapidamente com a toalha e antes que ele pudesse pensar em fazer alguma coisa eu expulsei ele do meu quarto ameaçando bater com uma pá de lixo na cabeça dele.

Tranquei a porta e fiquei sentada do lado da minha cama com os braços abraçando as minhas pernas.

Eu estava me escondendo de mim mesma. No outro dia eu acordei ali daquele mesmo jeito, com o rosto inchado de tanto chorar, mas pronta pra mais um dia de luta, pra ele era como se nada tivesse acontecido e aquilo era o que estava me corroendo por dentro.

Por anos eu me senti culpada por aquilo, nunca mais usei uma bermuda ou algo que mostrasse demais o meu corpo, eu era uma menina de 21 anos virgem que achava que qualquer homem que se aproximasse do meu corpo iria fazer a mesma coisa que aquele velho doente fez.

Ele me traumatizou. Hoje, quase um ano depois, faz uma semana da morte do homem que dizia ser meu avô, e eu ainda me sinto como aquela garota frágil que eu me tornei por causa dele. Isso vai ficar marcado em mim pra sempre.

Respirei fundo e abri meus olhos, pronta pra encarar mais um dia. Estou parecendo um panda de tantas olheiras, mas o trabalho não espera.

Levantei e fui até o banheiro do meu quarto, tomei um banho gelado pra acordar e escovei os meus dentes. Coloquei o meu uniforme e peguei a minha bolsa com tudo que eu precisava, depois de arrumar a minha cama que estava completamente bagunçada por eu ter rolado nela a noite toda.

Desci as escadas e corri contra o tempo pra fazer um café daqueles, pelo menos pra ficar acordada o dia todo.

Tomei aquele café forte enquanto via o jornal da manhã e fiquei boquiaberta com o tanto de violência que temos nesse Rio de Janeiro, o morro da providência tem invasão quase todo dia, antes de morar aqui eu morava em uma casa na entrada da favela e aquilo ali não é pra qualquer um.

Ficava me protegendo das balas perdidas embaixo da cama e o meu pensamento só ia nas mães com bebês pequenos que estavam ali por necessidade e não tinham pra onde correr.

O meu coração ficava apertado. Sai dos meus devaneios voltando a minha realidade, hoje em dia sou feliz por poder estar longe de tudo aquilo, por mais que la tenha muitas pessoas de bem aquela vida não é pra mim, eu não aguentaria por muito mais tempo.

Desliguei a televisão e fechei a casa, chamei um uber pro meu consultório de veterinária. Um fato sobre mim é que eu amo o que eu faço com todas as minhas forças, mas o meu sonho profissional mesmo é ser biologa, é o que realmente me encanta, mas aqui no Brasil essa profissão é tão desvalorizada que eu acabei desistindo desse sonho louco.

Se um dia eu tiver a chance de realizar é óbvio que não vou abrir mão, mas enquanto essa oportunidade não cai do céu eu continuo matando um leão por dia pra conseguir sobreviver.